12 agosto 2024

Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem

Estudo proferido na Escola Bíblica Dominical na Igreja Presbiteriana do Ibura, em Recife/PE. 

ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER 
Capítulo VIII. De Cristo, o Mediador 


Na seção II do capítulo 8, temos o seguinte:
Seção II. O Filho de Deus, a Segunda Pessoa da Trindade, sendo verdadeiro e eterno Deus, da mesma substância do Pai e igual a ele, quando chegou o cumprimento do tempo, tomou sobre si a natureza humana com todas as suas propriedades essenciais e enfermidades comuns, contudo sem pecado, sendo concebido pelo poder do Espírito Santo no ventre da Virgem Maria e da substância dela. As duas naturezas, inteiras, perfeitas e distintas - a Divindade e a humanidade - foram inseparavelmente unidas em uma só pessoa, sem conversão, composição ou confusão; essa pessoa é verdadeiro Deus e verdadeiro homem, porém, um só Cristo, o único Mediador entre Deus e o homem.
O cerne da fé cristã reside na pessoa de Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem, que transcende os limites da compreensão humana em virtude de sua natureza dual. A doutrina da União Hipostática, pilar fundamental da cristologia, postula a coexistência indissolúvel das naturezas divina e humana em Cristo, sem confusão, divisão ou alteração. Essa concepção teológica, ao longo dos séculos, tem suscitado intensos debates e controvérsias, desafiando a racionalidade humana a apreender o mistério da encarnação e a reconciliar a divindade e a humanidade em uma única pessoa.

A Necessidade da Humanidade de Cristo

A Bíblia deixa claro que Jesus, a segunda pessoa da Trindade, assumiu a natureza humana em um ato de auto-humilhação e amor sacrificial (João 1:14; Filipenses 2:5-8; Romanos 5:8; João 3:16; Mateus 20:28). Essa encarnação era essencial para a obra redentora de Cristo, pois somente um homem poderia sofrer a penalidade do pecado em lugar da humanidade (Hebreus 9:27). Hebreus 2:14-17 afirma que Ele "participou" da carne e sangue, tornando-se semelhante aos seus "irmãos" em todos os aspectos, exceto no pecado.

A humanidade de Cristo se manifesta em:

  • Nascimento de uma mulher: A concepção de Jesus no ventre da virgem Maria pelo poder do Espírito Santo demonstra sua entrada real na história humana como um de nós (Mateus 1:18; Lucas 1:35; João 1:14).
  • Corpo físico: As Escrituras descrevem Jesus com um corpo real, sujeito a necessidades e fragilidades humanas como fome, sede, cansaço e dor (João 4:6-8; Lucas 24:41-43; Hebreus 2:17; Marcos 15:34). Ele suou, chorou, sentiu fome e experimentou a morte física na cruz (Lucas 22:44; João 11:35; Marcos 15:37; Atos 2:24).
  • Alma humana: Jesus possuía uma alma humana, comprovada por suas emoções, intelecto e desenvolvimento moral. Ele "crescia em sabedoria" (Lucas 2:46-52; Mateus 7:28-29) e experimentou profunda tristeza e angústia (Marcos 14:33).
  • Limitações humanas: Apesar de ser Deus, Jesus, em sua natureza humana, se submeteu às limitações do tempo e espaço. Ele não estava presente em todos os lugares ao mesmo tempo, como afirma a doutrina da onipresença divina (Marcos 6:31).
É crucial reconhecer a plena humanidade de Cristo para entender o alcance de seu sacrifício. Ele se esvaziou de sua glória divina, tomando a forma de servo e se tornando obediente até a morte (Filipenses 2:6-8; João 1:14).

A Realidade da Divindade de Cristo

As Escrituras testificam com igual ênfase que Jesus Cristo é plenamente Deus, coexistindo eternamente com o Pai e o Espírito Santo em perfeita unidade e igualdade. Diversas evidências bíblicas apontam para sua divindade:

  • Títulos divinos: A Bíblia atribui a Jesus nomes e títulos reservados exclusivamente a Deus, como "Deus" (João 1:1; Romanos 9:5), "Senhor" (Filipenses 2:9-11; Colossenses 1:19), "Verbo" (João 1:1-3) e "Eu Sou" (João 8:58).
  • Atributos divinos: A Bíblia aplica a Jesus atributos exclusivos de Deus, como eternidade (Miquéias 5:2; Hebreus 1:8), onisciência (João 2:25; Apocalipse 2:23), onipresença (Mateus 28:20; João 3:13) e onipotência (Filipenses 4:13; Colossenses 1:16).
  • Obras divinas: Jesus realizou obras que somente Deus pode realizar, como a criação do universo (João 1:3; Colossenses 1:16), a sustentação de todas as coisas (Hebreus 1:3) e a ressurreição dos mortos (João 5:21,25).
  • Adoração divina: A Bíblia ordena e relata a adoração a Jesus Cristo como Deus. Anjos e homens o adoram (Hebreus 1:6; Lucas 24:52), e o batismo é realizado em seu nome, juntamente com o Pai e o Espírito Santo (Mateus 28:19).
A divindade de Cristo é confirmada por sua própria consciência e reivindicações. Ele se autodeclarou igual a Deus (João 5:17), afirmou existir antes de Abraão (João 8:58) e perdoou pecados, uma prerrogativa divina (Marcos 2:1-12).

Negar a divindade de Cristo é reduzir sua pessoa a um mero homem, invalidando seu sacrifício expiatório e minando o fundamento da fé cristã. Se Jesus não fosse Deus, ele não teria poder para perdoar pecados, vencer a morte e conceder a vida eterna.

A União Incompreensível: Duas Naturezas em Uma Pessoa

A união hipostática, a união das naturezas divina e humana em uma única pessoa, está além da capacidade humana de compreensão plena. As Escrituras afirmam essa união sem tentar explicá-la em termos filosóficos. No entanto, a Bíblia oferece vislumbres que iluminam essa doutrina profunda:

  • Unidade: As duas naturezas de Cristo coexistem em perfeita harmonia e unidade, sem mistura, confusão, separação ou divisão.
  • Distinção: As naturezas divina e humana, embora unidas em Cristo, mantêm suas propriedades distintas. A divindade não se torna humana nem a humanidade divina.
  • Integração: As duas naturezas operam em perfeita harmonia na pessoa de Cristo. Atributos e ações podem ser atribuídos a sua pessoa, independentemente de se originarem em sua natureza divina ou humana. Por exemplo, (1) Jesus realizando milagres: Ao curar os enfermos, ressuscitar os mortos e controlar os elementos da natureza, Jesus demonstrava seu poder divino, mas ao mesmo tempo expressava sua compaixão humana. (2) Jesus sofrendo: Ao ser tentado, sentir fome, sede e fadiga, Jesus experienciou as mesmas limitações que nós, demonstrando sua plena humanidade. (3) Jesus perdoando pecados: Ao perdoar os pecados, Jesus exercia seu poder divino de autoridade sobre o pecado, mas ao mesmo tempo demonstrava sua misericórdia e graça.
A união hipostática é um mistério revelado por Deus e recebido pela fé. Embora desafie a compreensão humana, essa doutrina é a base para a salvação. Somente um Salvador que é plenamente Deus e plenamente homem pode ser o mediador perfeito entre Deus e a humanidade, satisfazendo as demandas da justiça divina e, ao mesmo tempo, se compadecer de nossas fraquezas.

A Doutrina das duas naturezas de Cristo ao longo da história

A igreja cristã enfrentou muitos desafios à doutrina da divindade de Cristo ao longo de sua história, particularmente nos séculos IV e V. Esses desafios, frequentemente chamados de heresias, forçaram a igreja a definir mais claramente suas crenças e convocar concílios para resolver disputas doutrinárias e condenar os ensinamentos heréticos.

Aqui estão alguns exemplos importantes:

  • Docetismo: Essa heresia, prevalente nos primeiros séculos da igreja, negava a verdadeira humanidade de Cristo, afirmando que ele apenas parecia ter um corpo físico. A igreja primitiva rejeitou fortemente o docetismo, enfatizando a realidade da encarnação de Cristo e a importância de sua humanidade para a salvação. O apóstolo João, por exemplo, argumentou que negar que Jesus realmente se manifestou na carne era uma marca do anticristo (1 João 4:2,3).
  • Arianismo: Surgindo no século IV, o arianismo, liderado por Ário, ensinava que Jesus era um ser criado, embora exaltado, e não eterno e igual a Deus, o Pai. O Concílio de Nicéia, em 325 d.C., foi convocado especificamente para lidar com essa heresia. O concílio rejeitou o arianismo, afirmando que Jesus é "gerado, não criado" e "da mesma substância (homoousios) do Pai". Essa declaração enfatizou a plena divindade de Cristo e sua igualdade com o Pai (ver João 1:1; Hebreus 1:3; Filipenses 2:6; Colossenses 1:15-17; João 14:9).
  • Monofisismo: Essa heresia, surgindo no século V, afirmava que Jesus tinha apenas uma natureza, uma mistura divina e humana, em vez de duas naturezas distintas (divina e humana) unidas em uma pessoa. O Concílio de Calcedônia, em 451 d.C., condenou o monofisismo, afirmando que Jesus Cristo é "perfeitamente Deus e perfeitamente homem" em duas naturezas "sem mistura, confusão, separação ou divisão".
Além dessas grandes heresias, a igreja lidou com outras variações de crenças sobre a natureza de Cristo:

  • Apolinarismo: Essa heresia negava a plena humanidade de Cristo ao afirmar que ele não possuía uma alma humana, mas que o Logos divino (a Palavra) tomava o lugar de sua alma. A igreja rejeitou essa visão, afirmando que Cristo tinha tanto um corpo quanto uma alma humana, além de sua natureza divina.
  • Nestorianismo: Contrário ao monofisismo, o nestorianismo enfatizava demais a distinção entre as naturezas divina e humana de Cristo, sugerindo que ele era duas pessoas distintas. A igreja rejeitou essa visão, afirmando a unidade da pessoa de Cristo, enquanto mantinha a distinção de suas duas naturezas.
Esses debates e as definições doutrinárias resultantes moldaram profundamente a teologia cristã e continuam sendo tópicos importantes de discussão e estudo teológico hoje.

Considerações e Conclusões

A doutrina da união hipostática nos convida a contemplar o amor incomensurável de Deus, que enviou seu Filho ao mundo na semelhança da carne pecaminosa para nos reconciliar consigo mesmo.

Em Cristo, encontramos a expressão máxima da graça e da verdade. Ele é o único caminho para o Pai, o único nome dado entre os homens pelo qual podemos ser salvos (ver João 14:6; Atos 4:10-12; Romanos 5:8). Que a contemplação da pessoa de Cristo, Deus encarnado, gere em nós profunda gratidão, adoração e um desejo insaciável de conhecê-lo mais e viver para a sua glória.


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