19 dezembro 2024

A esquerda e os riscos à Igreja

A esquerda apresenta riscos significativos à igreja e à Bíblia, manifestando-se em várias formas que desafiam os fundamentos da fé cristã. Um dos principais riscos reside na filosofia coletivista da esquerda, que ignora a natureza individual dos seres humanos. Essa visão pode levar a uma subordinação do indivíduo à vontade do Estado, o que é contrário aos princípios de liberdade individual e responsabilidade pessoal que são centrais ao cristianismo.

Além disso, a esquerda moderna, segundo o Dr. Lyle H. Rossiter em seu livro "A Mente Esquerdista", muitas vezes rejeita a competência e a soberania do indivíduo comum, favorecendo a autoridade de elites esquerdistas. Isso se reflete em uma expansão das funções do governo, resultando em leis opressivas e na rendição das liberdades pessoais. Essa tendência coletivista pode corroer o caráter dos indivíduos ao retirá-los de suas responsabilidades e obrigações, levando a uma dependência do governo que é incompatível com a autonomia e a iniciativa defendidas pela fé cristã.

Um dos maiores desafios para a igreja é a negação do pecado por parte do cristianismo progressista, que é uma corrente dentro da esquerda. Essa abordagem separa o que a Bíblia uniu, enfatizando o comportamento gracioso em detrimento da crença na verdade. Ao rejeitar o ensino bíblico sobre o pecado, essa visão também rejeita a necessidade da obra salvífica de Cristo, interpretando a morte de Jesus como algo diferente do pagamento pelos pecados da humanidade.

Outro risco significativo é a ênfase da esquerda na moralidade em detrimento da doutrina. Para a esquerda, o mais importante é como nos comportamos, e não o que cremos. Essa visão pode levar a uma relativização da verdade e a uma desvalorização da teologia, que é essencial para o entendimento e a prática da fé cristã. A esquerda muitas vezes critica a igreja por se preocupar excessivamente com a ortodoxia, confundindo essa preocupação com legalismo e hipocrisia.

A esquerda também apresenta uma visão simplista da fé cristã, retratando-a como uma "jornada" espiritual individual em vez de uma mensagem de salvação revelada por Deus. Isso leva a uma desvalorização da unidade do grupo em prol da busca pessoal, e a uma relativização da verdade, onde nenhuma certeza pode ser afirmada. A esquerda critica a igreja por sufocar o pensamento livre e por não aceitar questionamentos, quando, na verdade, o que a incomoda é a afirmação da igreja de que existem respostas para esses questionamentos.

Outro ponto crítico é a visão da esquerda sobre a igreja, que é vista como uma instituição falha e dispensável, com foco apenas horizontal (relações humanas), negligenciando o propósito vertical da igreja (relação com Deus). Para a esquerda, a igreja deve resolver problemas sociais, mas não priorizar a adoração e a proclamação da palavra de Deus.

Além disso, a esquerda muitas vezes considera a paz como mais importante que o poder, levando a uma abordagem excessivamente igualitária e pacifista que pode comprometer a autoridade da igreja e sua capacidade de defender a verdade. Martinho Lutero já afirmou: "A paz, se possível, mas a verdade, a qualquer preço". A esquerda também tende a justificar comportamentos pecaminosos com base em dificuldades e sofrimentos, relativizando os mandamentos de Deus.

Os desafios que a igreja precisa lutar incluem:

● Defender a verdade bíblica: A igreja deve permanecer firme no ensino da Bíblia sobre o pecado, a salvação em Cristo e a importância da doutrina.

● Promover a responsabilidade pessoal: A igreja deve ensinar a importância da autonomia e da responsabilidade pessoal, evitando a dependência do governo e a relativização das obrigações.

● Valorizar a teologia: A igreja deve defender o valor da teologia como essencial para o entendimento da fé cristã e refutar a ideia de que o comportamento é mais importante do que a crença.

● Proteger a unidade da igreja: A igreja deve promover a unidade do grupo e não a individualidade excessiva, reconhecendo que a verdade revelada por Deus é o fundamento da fé.

● Afirmar o propósito da igreja: A igreja deve reafirmar seu propósito vertical de glorificar a Deus e proclamar sua palavra, além de seu papel horizontal de servir ao próximo.

● Exercer autoridade bíblica: A igreja deve exercer sua autoridade para defender a verdade e condenar o erro, sem ceder a visões igualitárias que enfraquecem sua capacidade de guiar e proteger o rebanho.

● Combater a relativização moral: A igreja deve desafiar a ideia de que dificuldades justificam o pecado, e reafirmar os padrões morais estabelecidos por Deus.

A igreja deve estar vigilante e discernir os riscos que a esquerda apresenta, buscando permanecer fiel à Bíblia e aos seus princípios. A luta contra os desafios apresentados pela esquerda é crucial para a preservação da fé cristã e a integridade da igreja.


11 dezembro 2024

A Importância da Membresia na Igreja

Um Compromisso Bíblico e Transformador 

A membresia em uma igreja local é um elemento central na vivência plena da fé cristã, transcendendo a simples formalidade para estabelecer-se como um pilar fundamental na caminhada espiritual. Ao longo das Escrituras, percebe-se que a membresia não é uma escolha opcional, mas sim um imperativo divino, essencial para aqueles que desejam viver de acordo com os desígnios de Deus.

Primeiramente, a membresia na igreja representa um pacto solene entre o cristão e a comunidade de fé à qual ele pertence. Este compromisso vai além da frequência a cultos ou reuniões; implica submissão à autoridade eclesiástica, responsabilidades mútuas com os irmãos na fé e uma aliança pública de fidelidade a Cristo. A exortação de Hebreus 10:25 reforça a importância de não abandonar a congregação, evidenciando que a membresia não é uma prática opcional, mas uma expressão concreta de obediência à Palavra de Deus.

Além disso, a membresia é um testemunho público de identificação com Cristo e Sua Igreja. Em Mateus 16:18, Jesus afirma que edificará Sua igreja, declarando que nem mesmo as portas do inferno prevalecerão contra ela. Assim, rejeitar ou negligenciar a membresia é, em certo sentido, questionar a sabedoria divina e distanciar-se da estrutura estabelecida por Cristo para sustentar e guiar Seu povo.

Historicamente, a igreja local sempre desempenhou um papel crucial na formação e no crescimento espiritual dos cristãos. O livro de Atos dos Apóstolos apresenta a vida cristã como indissociável da vida em comunidade. A interdependência entre os membros é um tema recorrente, e a membresia oferece uma estrutura para que os dons espirituais sejam exercidos, promovendo edificação mútua. Observe:

  • Em Atos 2:42-47 descreve a dedicação da igreja primitiva ao ensino dos apóstolos, à comunhão, ao partir do pão e às orações. Os versículos 44-45 destacam como os membros compartilhavam tudo o que tinham, provendo uns aos outros conforme a necessidade, ilustrando a interdependência e a edificação mútua: "Todos os que criam estavam juntos e tinham tudo em comum. Vendiam suas propriedades e bens, distribuindo o produto entre todos, à medida que alguém tinha necessidade".
  • Em Atos 4:32-35 novamente vemos a união e a generosidade da igreja primitiva, que agiam como uma só família. Esse texto enfatiza a solidariedade e o apoio mútuo entre os membros: "Da multidão dos que creram, era um o coração e a alma. Ninguém considerava exclusivamente sua nenhuma das coisas que possuía; tudo, porém, lhes era comum".
  • Em Atos 6:1-7 há o relato que destaca como a igreja local organizava sua comunidade para atender às necessidades específicas de seus membros, como a distribuição de alimentos às viúvas. Esse episódio também demonstra o exercício dos dons espirituais e a colaboração entre os membros para edificar a comunidade: "Escolheram Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo, e mais seis outros. [...] E a palavra de Deus crescia, e o número dos discípulos se multiplicava grandemente em Jerusalém".
  • Em Atos 11:19-26 vemos como a igreja em Antioquia exemplificava a vida comunitária promovendo o crescimento espiritual e a evangelização. O trabalho conjunto de Barnabé e Paulo edificou a comunidade, resultando no primeiro uso do termo "cristãos": "E aconteceu que, por todo um ano, se reuniram naquela igreja e ensinaram numerosa multidão; em Antioquia, foram os discípulos, pela primeira vez, chamados cristãos".
  • Em Atos 20:28, Paulo exorta os presbíteros da igreja em Éfeso a cuidarem do rebanho, destacando o papel da liderança espiritual em preservar e fortalecer a comunidade: "Cuidem de vocês mesmos e de todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo os colocou como bispos, para pastorearem a igreja de Deus, que ele comprou com o seu próprio sangue".
  • E também vemos em Gálatas 6:10, Paulo destacando a responsabilidade de fazer o bem, "especialmente àqueles que pertencem à família da fé", evidenciando o compromisso coletivo que caracteriza a vida cristã.
Ademais, a membresia estabelece responsabilidades claras e privilégios para os crentes. Entre essas responsabilidades estão: a submissão à liderança espiritual, a participação ativa no discipulado mútuo, o envolvimento em ações de evangelização e o apoio ao ministério da igreja. Paralelamente, a membresia proporciona um ambiente seguro para a disciplina eclesiástica, visando restaurar aqueles que caem em pecado e proteger a pureza da comunidade, conforme descrito em Mateus 18 e 1 Coríntios 5.

Outro aspecto essencial da membresia é a demonstração de uma fé genuína por meio de uma vida transformada. Como ensina Mateus 3:8, "frutos dignos de arrependimento" são a evidência de uma conversão verdadeira. A igreja tem o papel de avaliar essa profissão de fé, garantindo que seus membros vivam de acordo com os princípios bíblicos. Dessa forma, a santidade visível torna-se um pré-requisito para a membresia, contribuindo para a preservação do testemunho cristão no mundo.

Embora os aspectos estruturais da membresia possam variar entre culturas e contextos, o princípio bíblico permanece imutável: a membresia deve refletir um compromisso sério com a fé, a submissão à liderança eclesiástica e o amor pelo corpo de Cristo. Processos como entrevistas, aulas de preparação e listas de membros são adaptações culturais, mas todos visam cumprir os objetivos de discipulado, supervisão espiritual e preservação da pureza da igreja.

Em conclusão, a membresia na igreja local não é meramente um aspecto organizacional, mas uma expressão prática de compromisso com Cristo, submissão à Sua Palavra e amor ao Seu povo. Ela é essencial para o crescimento espiritual, o serviço mútuo e a proclamação do evangelho. Portanto, valorizar e aderir à membresia é um testemunho de obediência e fidelidade ao propósito divino para a igreja, promovendo o fortalecimento da fé individual e coletiva.


27 novembro 2024

O Discipulado Cristão como Caminho de Renúncia e Promessa de Eternidade

O discipulado cristão é um chamado à entrega total a Cristo, demandando compromisso incondicional, abnegação e o primado do amor a Deus sobre todas as coisas. Esse amor se manifesta na obediência aos mandamentos divinos, como nos ensina Jesus: "Se me amais, guardareis os meus mandamentos" (João 14:15). A busca pela santidade, refletida no desejo de viver em conformidade com a vontade de Deus, também é inerente ao discipulado, como exorta o apóstolo Pedro: "Como é santo aquele que vos chamou, tornai-vos santos também vós mesmos em todo o vosso procedimento" (1 Pedro 1:15).

A necessidade de negar a si mesmo é um tema fundamental quando se discute o discipulado. O ser humano é advertido a não buscar em si próprio a sabedoria e a força, mas sim em Deus, reconhecendo sua dependência e submissão ao Senhor. Jesus, em seu chamado ao discipulado, afirma: "Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me" (Mateus 16:24). A disposição de abandonar tudo por amor a Ele é vista como sinal de um coração verdadeiramente convertido, pronto a seguir o Mestre sem reservas.

Essa renúncia, porém, não se configura como um sacrifício sem propósito. A promessa de um tesouro eterno nos céus, constantemente evocada nas Escrituras, serve como âncora da esperança do cristão em meio às adversidades. Jesus consola seus discípulos, afirmando: "Não acumuleis para vós outros tesouros sobre a terra, onde a traça e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam; mas ajuntai para vós outros tesouros no céu, onde traça nem ferrugem corroem, e onde ladrões não escavam, nem roubam" (Mateus 6:19-20). Essa promessa de eternidade, um tesouro reservado nos céus para aqueles que perseverarem na fé, é a força motriz que impulsiona o discípulo em sua caminhada. Jesus assegura: "Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fora, eu vo-lo teria dito. Pois vou preparar-vos lugar. E, quando eu for e vos tiver preparado lugar, voltarei e vos tomarei para mim, para que, onde eu estou, estejais vós também" (João 14:2-3).

A busca pela comunhão com Deus, a alegria em Seus ensinamentos e a certeza da vida eterna são tesouros incomparáveis, que transcendem qualquer bem material ou prazer passageiro. O apóstolo Paulo, experienciando as riquezas da vida em Cristo, declara: "Mas o que, para mim, era lucro, isto considerei perda por causa de Cristo. Sim, deveras considero tudo como perda, por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; por amor do qual perdi todas as coisas e as considero como refugo, para ganhar a Cristo" (Filipenses 3:7-8).

Ser discípulo de Cristo não se limita à mera aceitação de um conjunto de doutrinas. É uma transformação radical da vida, moldada pelos ensinamentos do Mestre. A obediência aos mandamentos divinos, a busca pela santidade e o amor ao próximo são elementos indissociáveis dessa jornada. O próprio Jesus resume o mandamento principal: "Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. O segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo" (Mateus 22:37-39).

O discipulado cristão é um caminho de constante aprendizado e aperfeiçoamento, tendo Cristo como modelo e meta. É um convite a reconhecer as próprias falhas, arrepender-se dos pecados e confiar na graça de Deus para promover a transformação. O apóstolo Paulo nos encoraja a essa busca incessante: "Prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus" (Filipenses 3:14).

Em síntese, o discipulado cristão, embora exija renúncia, oferece como recompensa a promessa de uma vida plena e eterna em comunhão com Deus. A autonegação, a obediência aos mandamentos divinos, a busca pela santidade e a esperança na vida eterna são pilares que sustentam essa caminhada da fé. É um chamado à transformação, tendo Cristo como modelo e a glória de Deus como objetivo final, como exorta o apóstolo Paulo: "E tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como para o Senhor e não para homens" (Colossenses 3:23).


20 novembro 2024

Dificuldades e soluções na prática da Fé Cristã

Há uma infinidade de desafios que os cristãos contemporâneos enfrentam ao viver sua fé em um mundo complexo e em constante mudança. Neste artigo, vamos tentar explorar essas dificuldades com profundidade, oferecendo uma perspectiva bíblica e teológica para a compreensão e superação desses obstáculos.

A tarefa de conciliar os ensinamentos bíblicos, escritos em contextos históricos e culturais distintos, com a realidade do século XXI é um dos desafios mais urgentes. A rápida transformação social, os avanços científicos e o questionamento constante de valores tradicionais colocam os cristãos em uma posição delicada, exigindo discernimento e sabedoria para navegar por essas complexidades sem comprometer a integridade de sua fé.

Há também as dificuldades internas que os cristãos enfrentam, como a luta contra o pecado, a persistência de dúvidas e o sofrimento inerente à condição humana. A natureza pecaminosa, mesmo após a conversão, torna a obediência a Deus um desafio constante. Dúvidas sobre a veracidade de experiências espirituais, a interpretação de passagens bíblicas complexas e a aparente ineficácia da oração em certos momentos também podem abalar a fé do cristão. O sofrimento, seja por doença, perseguição ou crises pessoais, levanta questões sobre a bondade e o cuidado de Deus, levando alguns a questionar sua fé.

A proliferação de falsos ensinamentos, seitas e distorções da mensagem cristã também representa um obstáculo significativo. A teologia da prosperidade, com sua ênfase em riqueza material como sinal de bênção divina, e a proliferação de práticas supersticiosas sem base bíblica, como a "quebra de maldições", são exemplos de desvios que seduzem muitos, levando-os para longe da verdadeira fé.

A diversidade de denominações e igrejas, com suas diferentes interpretações da Bíblia e práticas distintas, também gera dificuldades para os cristãos. A busca pela unidade (ecumenismo) esbarra em desafios teológicos e práticos, especialmente na definição de uma base comum para a comunhão autêntica. O movimento dos "desigrejados", que rejeitam não somente a comunhão mas a estrutura institucional da igreja, também representa um desafio à visão tradicional de comunidade cristã.

Também precisamos considerar a necessidade de integrar a fé com a razão, a ciência e a cultura, que permanece como uma tarefa complexa para os cristãos. A teoria da evolução, por exemplo, coloca em dúvida a narrativa bíblica da criação, gerando tensões entre a fé e o conhecimento científico. A interação com diferentes culturas e sistemas de valores exige dos cristãos discernimento para preservar a integridade de sua fé sem se fechar ao diálogo e à compreensão do outro.

As dificuldades na prática da fé cristã são, portanto, multifacetadas e estão por toda parte e afetam diferentes áreas da vida, demandando dos cristãos uma fé resiliente, um conhecimento sólido das Escrituras e um compromisso inabalável com a verdade de Deus. 

E qual a solução?

Não podemos oferecer uma solução única e abrangente para as dificuldades na prática da fé cristã, mas, sim, um conjunto de princípios, orientações e atitudes que podem auxiliar os cristãos a navegar por esses desafios.

1. A importância do estudo aprofundado da Bíblia. O conhecimento profundo das Escrituras é fundamental para a base da fé e da prática cristã. O estudo constante da Bíblia permite aos cristãos compreenderem melhor o contexto histórico e cultural dos textos sagrados, evitando distorções ou interpretações equivocadas. Além disso, esse estudo oferece respostas para questões complexas e desafiadoras, orientando os fiéis a discernir a vontade de Deus para suas vidas, tomar decisões sábias e alinhar suas ações aos princípios divinos.

2. O valor da oração como comunicação com Deus. A oração é um canal indispensável de conexão entre o cristão e Deus. Por meio dela, os fiéis apresentam suas necessidades, ansiedades e dúvidas, encontrando consolo e direção. A prática da oração também é um momento de gratidão, no qual se reconhece a soberania divina e as bênçãos recebidas. Assim, a oração fortalece a fé, aprofunda a intimidade com Deus e ensina os cristãos a confiar em Sua providência e descansar em Suas promessas.

3. A resiliência diante do sofrimento como marca da fé. O sofrimento é parte inevitável da caminhada cristã, mas também uma oportunidade de crescimento espiritual. Enfrentá-lo com resiliência permite aos cristãos dependerem mais profundamente de Deus e confiarem em Seus propósitos, mesmo em meio à dor. A Palavra de Deus e a comunhão com outros cristãos oferecem força e encorajamento, ajudando os fiéis a perseverarem na fé enquanto mantêm o foco na esperança da vida eterna e na vitória final em Cristo.

4. A luta contra o pecado e o relativismo cultural. A batalha contra o pecado é constante na vida cristã, exigindo o reconhecimento da necessidade de arrependimento e transformação interior, operada pelo Espírito Santo. Permanecer fiel aos princípios bíblicos é essencial, especialmente em um mundo onde o relativismo cultural busca diluir a verdade absoluta da Palavra de Deus. Os cristãos são chamados a buscar a santificação em todas as áreas da vida, obedecendo aos mandamentos de Deus e cultivando virtudes cristãs.

5. O discernimento em meio a falsos ensinamentos. Diante da disseminação de falsas doutrinas e práticas supersticiosas, os cristãos devem estar preparados para discernir a verdade. Isso requer um conhecimento sólido das Escrituras, que permita identificar e refutar ensinamentos que se desviem da revelação divina. Além disso, é necessário buscar a orientação do Espírito Santo para distinguir entre a verdadeira fé e os enganos, bem como participar de comunidades cristãs comprometidas com a pregação da sã doutrina.

6. A busca pela unidade na diversidade da igreja. A diversidade de denominações e interpretações bíblicas não deve ser motivo de divisão entre os cristãos. Há aqueles que têm a tendência de elevar um ensino doutrinário a um patamar tão elevado que qualquer um que discorde é taxado de réprobo, descrente e destinado ao inferno. No entanto, será essencial priorizar os fundamentos da fé cristã, como a Trindade, a divindade de Cristo, a salvação pela graça e a autoridade das Escrituras (essas doutrinas são essenciais a fé cristã e são inegociáveis!), enquanto se promove o amor e o respeito em questões secundárias tais como a forma de se batizar, a forma de governar a igreja ou como se dará a volta de Cristo. A unidade entre os cristãos fortalece o testemunho do Evangelho e contribui para a expansão do Reino de Deus.

7. A integração entre fé, razão, ciência e cultura. A fé cristã não está em oposição à razão, à ciência ou à cultura. Pelo contrário, ela busca dialogar de forma construtiva e crítica com essas áreas, contribuindo para uma compreensão mais ampla do mundo. Os cristãos são encorajados a estudar as descobertas científicas, participar dos debates culturais e apresentar sua fé de maneira racional e relevante. Ao fazer isso, tornam-se agentes de transformação, levando os princípios do Evangelho às diversas esferas da sociedade e promovendo justiça, paz e o bem comum.

As soluções propostas acima não são fórmulas mágicas ou respostas fáceis para problemas complexos. São, antes, um convite a uma vida de constante aprendizado, busca por Deus, compromisso com a verdade e ação transformadora no mundo. A jornada cristã é desafiadora, mas, através da graça de Deus e da obediência à Sua Palavra, os cristãos podem superar as dificuldades e viver uma vida plena de significado e propósito.


15 novembro 2024

A Subscrição Confessional aos Padrões de Westminster

A subscrição confessional representa a adesão formal e consciente a um conjunto específico de doutrinas e crenças baseadas nas Escrituras Sagradas, geralmente expressas em credos e confissões, como os Padrões de Westminster (Confissão de Fé e seus catecismos Maior e Breve). Essa adesão vai além do simples acordo intelectual, implicando um compromisso pessoal com a verdade revelada na Palavra de Deus e com a comunidade que a confessa. 

A aceitação aos símbolos de fé parte do pressuposto de que a fé cristã não é uma construção individual, mas sim um corpo de doutrinas revelado por Deus nas Escrituras. A subscrição a um credo ou confissão significa concordar com a interpretação da Escritura expressa naquele documento, reconhecendo a autoridade da igreja na definição da fé. A igreja, guiada pelo Espírito Santo, tem a responsabilidade de interpretar e transmitir a fé cristã de forma fiel. A subscrição confessional, nesse contexto, significa reconhecer essa autoridade e submeter-se ao ensino da igreja.

A subscrição confessional implica um compromisso de ensinar e viver de acordo com as doutrinas professadas nas Escrituras Sagradas, tanto na vida pessoal quanto no ministério. Pastores e líderes que subscrevem a um credo ou confissão assumem a responsabilidade de transmitir a fé de forma íntegra às próximas gerações.

Filosofias que Levam à Rejeição da Confessionalidade

É importante reconhecer que existem objeções à ideia de se subscrever a credos e confissões. Podemos inferir algumas correntes "filosóficas" dentro das igrejas que podem contribuir para a rejeição da confessionalidade:

● Individualismo: A ênfase na experiência pessoal e na liberdade individual pode levar à desvalorização da tradição e da autoridade da igreja na interpretação das Escrituras. Dentro das igrejas é comum se aceitar o movimento "nenhum Credo senão Cristo", que defende a primazia da experiência individual sobre qualquer credo formal. Essa visão pode levar a uma "privatização das convicções", onde cada indivíduo se sente no direito de interpretar as Escrituras à sua maneira, sem se submeter a qualquer autoridade externa.

● Relativismo: A crença de que não existem verdades absolutas e que a verdade é relativa a cada indivíduo ou cultura pode minar a importância de credos e confissões como expressões de verdades objetivas. Se a verdade é relativa, a necessidade de definir e defender um conjunto específico de doutrinas se torna questionável.

● Pragmatismo: A ênfase na utilidade prática e nos resultados imediatos pode levar à rejeição de credos e confissões, que podem ser vistos como teóricos e irrelevantes para a vida cristã. A busca por métodos "inovadores" de evangelização e crescimento da igreja pode levar à negligência da doutrina e da tradição em favor de estratégias que prometem resultados rápidos e visíveis.

● Anti-intelectualismo: A desconfiança da razão e da teologia sistemática pode levar à rejeição de credos e confissões como expressões de um cristianismo intelectualizado e distante da experiência do crente comum. Os púlpitos das igrejas estão fazendo uso de "slogans vagos" em detrimento de uma compreensão precisa das Escrituras. Essa tendência sugere uma preferência por mensagens simples e emocionais em detrimento do estudo aprofundado da doutrina.

A Confessionalidade como Ordenança Bíblica

Aderir a um conjunto de doutrinas expressas em credos e confissões, implica uma convicção profunda e um compromisso com essas mesmas doutrinas. Destacamos que a confessionalidade é, antes de tudo, uma ordenança bíblica, enraizada na própria natureza da fé cristã.

Quero chamar a atenção para o texto de Efésios 4:14 que diz: "Para que não sejamos mais meninos inconstantes, levados em roda por todo o vento de doutrina, pelo engano dos homens que com astúcia enganam fraudulosamente". Paulo fala sobre a importância de amadurecer na fé e ser bem fundamentado na verdade do Evangelho. Ele usa a metáfora de "vento de doutrina" para descrever falsas crenças ou ensinamentos que podem desviar os cristãos do caminho de Deus. Esses "ventos" são apresentados como estratégias astutas e enganosas que confundem e enfraquecem aqueles que não têm raízes firmes na Palavra de Deus.

Embora a expressão "vento de doutrina" seja específica de Efésios 4:14, outros versículos abordam temas similares, alertando contra falsos ensinamentos e instabilidade espiritual. Colossenses 2:8 alerta para termos "...cuidado, para que ninguém vos faça presa sua, por meio de filosofias e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os rudimentos do mundo, e não segundo Cristo". Este versículo alerta contra doutrinas baseadas em tradições humanas e filosofias contrárias à verdade de Cristo. 2 Timóteo 4:3-4 fala de um período de tempo "... em que não suportarão a sã doutrina; mas, tendo coceira nos ouvidos, amontoarão para si mestres conforme as suas próprias cobiças; e desviarão os ouvidos da verdade, voltando às fábulas". Aqui, Paulo prevê que as pessoas buscarão ensinamentos que satisfaçam seus desejos, rejeitando a verdade bíblica.

A Confessionalidade como Elo da Unidade na Igreja

A confessionalidade desempenha um papel crucial na promoção da unidade da Igreja. Podemos argumentar que a confissão da mesma fé, expressa em documentos como os Padrões de Westminster, serve como um eficiente elo que une os cristãos em diferentes tempos e lugares.

1. Padrão Comum de Fé

Unindo a Igreja Através dos Tempos: A confessionalidade conecta a igreja do presente com a igreja do passado, estabelecendo um fio condutor de fé que atravessa gerações. A subscrição a um credo histórico, como os Padrões de Westminster, significa unir-se à longa linhagem de cristãos que confessaram a mesma fé ao longo dos séculos. Essa conexão com a tradição da igreja oferece um senso de identidade e pertencimento, fortalecendo a unidade do corpo de Cristo.

Base para o Diálogo e a Comunhão: os credos e confissões reformados fornecem um vocabulário comum e um conjunto claro de doutrinas, facilitando o diálogo e a comunhão entre cristãos de diferentes origens e contextos. Em um mundo marcado por diferentes interpretações da Bíblia, os credos e confissões servem como um ponto de referência objetivo para o diálogo teológico. Ao concordarem com um padrão comum de fé, os cristãos podem se concentrar nas áreas de convergência, promovendo a compreensão mútua e o respeito, mesmo em meio a divergências.

2. Prevenção da Fragmentação Doutrinária

● Proteção Contra Erros e Heresias: A confessionalidade serve como um "muro de proteção" contra a proliferação de erros e heresias, preservando a pureza da fé cristã. Os credos e confissões definem os limites da ortodoxia, identificando e rejeitando ensinos que se desviam da verdade bíblica. Essa função de delimitação doutrinária é crucial para a unidade da igreja, pois impede a fragmentação causada pela disseminação de falsas doutrinas.

● Combate à Subjetividade e ao Individualismo: A confessionalidade se opõe à tendência individualista de interpretar a Bíblia de forma isolada e subjetiva, promovendo uma compreensão da fé baseada na tradição e na autoridade da igreja. Ao invés de cada um criar sua própria versão do cristianismo, a confessionalidade convida os cristãos a se submeterem a um padrão de fé estabelecido pela igreja, guiada pelo Espírito Santo. Essa submissão voluntária à autoridade da igreja na interpretação da Bíblia é essencial para a unidade da fé e a integridade doutrinária.

3. Clareza e Coerência do Ensino

● Base para a Pregação e o Ensino: A confessionalidade fornece uma base sólida para a pregação e o ensino da Palavra de Deus, garantindo a fidelidade ao ensino bíblico e a coerência doutrinária. Pastores e líderes que subscrevem a um credo ou confissão se comprometem a ensinar de acordo com os princípios estabelecidos nesses documentos, evitando distorções ou modismos teológicos.

● Formação de Cristãos Maduros: A confessionalidade contribui para a formação de cristãos maduros, que conhecem e compreendem a fé cristã de forma profunda e sistemática. Credos e confissões, como os Padrões de Westminster, oferecem um guia para o estudo da Bíblia, ajudando o cristão a conectar as diferentes doutrinas e a formar uma visão abrangente da fé. Essa compreensão aprofundada da fé é essencial para resistir às falsas doutrinas, discernir a vontade de Deus e viver uma vida cristã autêntica.

A confessionalidade, quando fundamentada na Escritura e guiada pelo Espírito Santo, é um instrumento essencial para a saúde, crescimento e unidade da Igreja. Ao fornecer um padrão comum de fé, proteger contra a fragmentação doutrinária e promover a clareza e coerência do ensino, a confessionalidade contribui para a edificação de um corpo unido em Cristo, testemunhando a verdade do Evangelho ao mundo.

Benefícios da Leitura dos Padrões de Westminster

A leitura dos Símbolos de Fé de Westminster oferece uma série de benefícios para o cristão, enriquecendo a sua compreensão espiritual, obediência e experiência. Como um conjunto de documentos confessionais, eles oferecem uma rica fonte de instrução e orientação para o cristão.

1. Aperfeiçoamento devocional

● O conhecimento preciso de Deus e da Sua obra, apresentado nos Padrões, aprimora as devoções e leva a melhores respostas de louvor e adoração.
● As doutrinas dos Padrões, por serem as doutrinas da Escritura, nutrem a devoção com a plenitude da verdade.
● A linguagem utilizada nos Padrões é rica em significado espiritual e desperta emoções religiosas, guiando para uma vida devocional profunda.

2. Compreensão bíblica profunda

● Os Padrões de Westminster são declarações fiéis do ensino bíblico, baseadas em princípios e ensinamentos extraídos de toda a Escritura, e não apenas de textos isolados.
● As provas bíblicas presentes nos Padrões convidam à reflexão cuidadosa sobre como os textos se relacionam com o assunto em questão e como devem ser entendidos.
● A leitura dos Padrões ajuda a pensar biblicamente, fornecendo uma estrutura sólida e declarações biblicamente corretas.

3. Clareza e precisão doutrinária

● Os Padrões combatem a superficialidade do cristianismo popular, que se contenta com slogans vagos em vez de uma compreensão precisa das Escrituras.
● As declarações dos Padrões são precisas e equilibradas, destacando a essência do Evangelho e separando-a de qualquer resquício de erro humano.
● A Assembleia de Westminster, por se beneficiar de séculos de reflexão sobre as Escrituras, formulou o ensino bíblico com clareza, precisão e riqueza.

4. Abordagem prática e detalhada

● Os Padrões apresentam um guia para a vida cristã, delineando as crenças que devem fundamentar a conduta prática do cristão.
● A explicação e aplicação detalhada dos Dez Mandamentos, encontrada no Catecismo Maior, por exemplo, oferece um manual prático para a vida diária.
● A abordagem detalhada dos Padrões abrange áreas de controvérsia, oferecendo um tratamento abrangente dos ensinamentos da Bíblia e ajudando a compreender o que a Escritura realmente ensina.

5. Estrutura organizada e sistemática

● Os Padrões organizam as doutrinas bíblicas de forma sistemática, proporcionando clareza e ajuda a organizar as doutrinas bíblicas na mente, aprofundando a compreensão da fé.
● A estrutura lógica dos Catecismos, em particular, fornece um quadro completo de entendimento.
● A leitura dos Padrões ajuda a evitar uma compreensão nebulosa e fragmentada das doutrinas bíblicas.

6. Compartilhamento eficaz da fé

● Os Padrões, apesar de sua profundidade e precisão, são acessíveis a pessoas sem treinamento teológico, tornando a verdade concisa e fácil de compartilhar.
● A leitura dos Padrões facilita a explicação das crenças cristãs e fornece um contexto objetivo para testemunhar a verdade.
● Os Padrões são vitais para a transmissão da verdade para a próxima geração, garantindo que a fé seja passada de forma íntegra e fiel.

Conclusão

Os Padrões de Westminster oferecem uma base sólida para o crescimento espiritual do cristão, aprofundando seu conhecimento das Escrituras, aprimorando suas devoções, fortalecendo sua fé e equipando-o para viver e compartilhar a verdade de forma eficaz.

A subscrição confessional, como um ato de compromisso com a verdade revelada e com a comunidade que a confessa, desempenha um papel fundamental na unidade, na pureza doutrinária e na fidelidade da igreja. No contexto da Igreja Presbiteriana do Brasil, a subscrição aos Padrões de Westminster é um elemento essencial que define sua identidade, sua doutrina e sua missão.


13 novembro 2024

A Vocação Eficaz

Estudo proferido na Igreja Presbiteriana do Ibura, em Recife/PE. 

ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER 
Capítulo X. Da Vocação Eficaz 


Na seção I do capítulo 10, temos o seguinte:

Seção I. Todos aqueles a quem Deus predestinou para a vida, e só esses, é ele servido chamar eficazmente pela sua Palavra e pelo seu Espírito, no tempo por ele determinado e aceito, tirando-os daquele estado de pecado e morte em que estão por natureza para a graça e salvação, em Jesus Cristo. Isso ele faz iluminando o entendimento deles, espiritual e salvificamente, a fim de compreenderem as coisas de Deus para a salvação, tirando-lhes o coração de pedra e dando-lhes um coração de carne, renovando as suas vontades e determinando-as, pela sua onipotência, para aquilo que é bom, e atraindo-os eficazmente a Jesus Cristo, mas de maneira que eles vêm mui livremente, sendo para isso dispostos pela sua graça.

A Confissão de Fé de Westminster inicia este capítulo afirmando que a vocação eficaz é direcionada exclusivamente àqueles que Deus predestinou para a vida, ou seja, aos Seus eleitos (Romanos 8:30; Efésios 1:4,5). Essa convocação se manifesta no tempo preordenado por Deus, e se concretiza por meio da Sua Palavra e do Seu Espírito (2 Timóteo 1:9; Romanos 10:17; João 6:63). É crucial notar que a Confissão distingue a vocação externa, direcionada a todos que ouvem a pregação do evangelho, da vocação interna e eficaz, operada pelo Espírito Santo e direcionada somente aos eleitos (Mateus 22:14; Atos 16:14). No entanto, o chamado interno só ocorre por causa do chamado externo (Romanos 10:14,15).

O texto da Confissão prossegue descrevendo o processo da vocação eficaz afirmando que Deus, através do Seu Espírito, atua nos corações dos eleitos, iluminando seus entendimentos para que compreendam as coisas de Deus para a salvação (1 Coríntios 2:12; Efésios 1:17,18). Essa iluminação espiritual é essencial, pois o homem, em seu estado natural, é espiritualmente cego e incapaz de discernir as verdades espirituais (João 6:44; 2 Coríntios 4:3,4). A Escritura confirma essa necessidade da ação divina para a compreensão das coisas espirituais: “Ora, o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente” (1 Coríntios 2:14).

Deus também opera uma transformação profunda no coração do eleito, removendo o coração de pedra, insensível à Sua lei e ao Seu amor, e concedendo um coração de carne, capaz de amar e obedecer a Deus (Jeremias 31:33; 2 Coríntios 5:17). A Confissão usa a linguagem de Ezequiel 36:26,27 para descrever essa transformação: "Dar-vos-ei coração novo, e porei dentro de vós espírito novo". Essa mudança radical é comparada nas Escrituras a um novo nascimento (João 3:3-6) e a uma nova criação (Efésios 2:10), ilustrando a profundidade e a abrangência da obra de Deus na vida do eleito.

A partir dessa nova disposição do coração, o eleito é capacitado a responder ao chamado de Deus (Efésios 2:4,5). Sua vontade, antes escravizada pelo pecado, é renovada e direcionada para o bem pela onipotência divina (Romanos 6:17,18; Romanos 8:2). Deus o atrai eficazmente a Cristo, de forma que ele vem livre e espontaneamente, movido pela graça que lhe foi concedida (João 6:37,44; Salmos 110:3). A Confissão enfatiza que essa resposta, embora livre e espontânea, só é possível pela graça operante de Deus, conforme expresso em Filipenses 2:13: "Porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade."

Podemos tirar algumas conclusões:

1. O papel da pregação do Evangelho. Vemos a importância da pregação do Evangelho na Vocação Eficaz. Deus ordenou que a Igreja pregasse o Evangelho a todos, pois "a fé vem pelo ouvir, e o ouvir pela palavra de Deus" (Romanos 10:17). Deus, em Sua soberania, usa a pregação para que os eleitos ouçam o Seu chamado. A pregação é o instrumento usado pelo Espírito Santo para efetuar a regeneração. No entanto, uma mesma pregação pode operar, pelo Espírito Santo, o chamado eficaz em alguns dos ouvintes, enquanto outros permanecem com seus corações insensíveis (Atos 13:48; Romanos 9:18). Paulo falando aos coríntios mostra como o mesmo evangelho pode ter efeitos diferentes, dependendo da ação soberana de Deus. Para os crentes, “cheiro de vida para a vida”; já para os incrédulos, “cheiro de morte para a morte” (2 Coríntios 2:15,16).

2. A Soberania de Deus na Salvação. A vocação eficaz é uma obra sobrenatural de Deus, pela qual Ele chama eficazmente os Seus eleitos à salvação. Essa obra se baseia em Sua livre e soberana graça, e não em qualquer mérito ou previsão do homem. Romanos 9:16 declara: "Logo, não depende do que quer, nem do que corre, mas de Deus, que usa de misericórdia". Deus é o único agente dessa obra, operando por meio do Seu Espírito e da Sua Palavra.

3. A Passividade Humana na Regeneração. O homem, em seu estado natural, é totalmente passivo na vocação eficaz, sendo incapaz de contribuir para sua própria salvação. É somente após ser vivificado e renovado pelo Espírito Santo que ele se torna capaz de responder ao chamado e abraçar a graça oferecida. Essa doutrina, embora possa ser questionada por alguns, encontra respaldo nas Escrituras, que afirmam a depravação total do homem e a sua incapacidade de buscar a Deus por si mesmo. Efésios 2:1-5 descreve o estado de morte espiritual do homem antes de ser vivificado por Cristo, e Romanos 3:10-12 declara que "não há justo, nem um sequer".

4. A Transformação Radical do Eleito. A vocação eficaz resulta em uma mudança completa na vida do eleito, afetando seu intelecto, suas emoções e sua vontade. Ele passa a ter uma nova compreensão das coisas de Deus, um novo amor por Ele e um novo desejo de obedecer à Sua vontade. Essa transformação não se limita a uma mudança superficial de comportamento, mas é uma mudança radical de natureza, operada pelo poder do Espírito Santo. O eleito, antes escravo do pecado, se torna um servo de Deus, livre para amar e obedecer ao seu Senhor. A Confissão de Fé de Westminster apresenta a doutrina da vocação eficaz como uma doutrina essencial da fé cristã, fundamentada nas Escrituras Sagradas e crucial para a compreensão da obra salvífica de Deus na vida do homem.

11 novembro 2024

Confessionalismo e uma Igreja Florescente

Algumas pessoas estão inclinadas a pensar que o confessionalismo tem um efeito sufocante na igreja. Elas presumem que a adesão a credos e confissões baseados na Bíblia inibe a vitalidade ou a liberdade. Para elas, a igreja tem mais a ver com relacionamento e desconfiam de coisas mais formais e menos subjetivas. Outras, querem ser tão flexíveis e inclusivas quanto possível, para atrair a outros, e minimizam a doutrina. Esses preconceitos sobre o confessionalismo são válidos? Eles são consistentes com as Escrituras? É notável, de fato, a frequência com que o crescimento da fé está ligado ao crescimento pessoal e coletivo dos crentes nas Escrituras.

Adotar e usar uma confissão de fé bíblica não garante que a vida de uma congregação específica seja tão saudável quanto deveria ser. Será, no entanto, para proteger contra certas doenças espirituais que vêm do falso ensino. Em Efésios 4, o apóstolo Paulo nos diz que a igreja deve florescer por meio da verdade. Ela é destinada a ser edificada no amor, quando falamos a verdade em amor (Efésios 4:13 e 15). Devemos todos chegar “à unidade da fé, e ao conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo”. Mas isso não pode acontecer se formos como meninos, “levados em roda por todo o vento de doutrina”. Ao “falar a verdade em amor” a igreja deve crescer “em tudo naquele que é a cabeça, Cristo” (Efésios 4:14-15).

Quanto menos a verdade da Bíblia confessamos, menos vitalidade temos. Os cristãos devem resistir ao erro e manter a verdade e assim andar em Cristo, sendo arraigados, edificados e estabelecidos na fé (Colossenses 2:6-7). A Bíblia não é minimalista no modo como declara a verdade e nem nós deveríamos ser. Uma confissão completa de fé convida os cristãos a explorar e valorizar o panorama da verdade de Deus e tornarem-se maduros em seu entendimento. Uma confissão ajuda a igreja a cumprir sua comissão de fazer discípulos espiritualmente maduros (Mateus 28:20).

A Importância das Confissões

Deus nos deu a Sua Palavra para que tenhamos a informação que Ele quer que saibamos. Uma confissão de fé é colocarmos em nossas próprias palavras o que entendemos que Deus está dizendo em Sua Palavra. Algumas pessoas dizem que não têm credo, a não ser a Bíblia. Mas elas ainda têm sua própria interpretação do que a Bíblia ensina. Elas acreditam ou não acreditam na Trindade, por exemplo, ou na justificação somente pela fé. Elas simplesmente não escreveram suas crenças de forma sistemática. Elas têm um credo, só que não é um que está publicamente disponível.

Enquanto isso, todos os tipos de hereges podem citar a Bíblia. Então, se nos restringimos a usar apenas as palavras da Escritura, isso seria uma maneira inadequada de declarar a verdade. Quando alguém cita a Escritura, é sempre legítimo perguntar: “O que você quer dizer com isso?” Dizer: “Eu só acredito na Bíblia” não tem sentido, a menos que isso seja definido mais adiante. Quando uma igreja anota seu entendimento do que a Bíblia ensina, ela permite que qualquer um veja em que ela acredita, e também ajuda a igreja a alcançar clareza em sua missão de dizer ao mundo o que a Palavra de Deus diz. É por isso que Judas nos exorta a “batalhar pela fé que uma vez foi dada aos santos” (Judas 3). Paulo encarregou Timóteo de manter firme o “modelo das sãs palavras” e de guardar “o bom depósito” (2 Timóteo 1:13-14).

Anthony Tuckney (1599-1670) desempenhou um papel fundamental na formação da Confissão de Fé de Westminster. Ele usa essas palavras de 2 Timóteo 1:13 para explicar o valor das confissões. Ele define confissões como uma forma de estabelecer a verdade de Deus de uma maneira ordenada. Elas reúnem as verdades que estão espalhadas por toda a Escritura. Ele então explica alguns dos benefícios de uma confissão.

Confissões nos Ajudam a Crescer na Verdade

Modelos de sãs palavras têm sido usados como declarações, não apenas daquilo em que nós mesmos acreditamos, mas também daquilo que pensamos ser o que todos deveriam crer. Também desejamos e exigimos que todos aqueles com quem nos unimos na comunhão mais próxima da igreja devem professá-las ou pelo menos não contradizê-las abertamente. Foi assim com os apóstolos no que eles decidiram em Atos 15, e é com as igrejas e suas confissões até hoje; e assim poderá ser sempre. Quando surgem controvérsias, elas podem ser melhor compreendidas e resolvidas com a ajuda de tais confissões. Elas também podem ser um bom depósito (2 Timóteo 1:14) a ser dado à posteridade, como legados ou heranças da fé de seus antepassados.

Confissões nos Ajudam a Crescer em União

As confissões não são apenas emblemas de nossa comunhão na igreja cristã, mas também são de grande ajuda e podem favorecê-la. Por este meio, as divisões problemáticas podem ser evitadas e a paz da igreja melhor preservada. Este é um benefício quando todos professamos a mesma verdade, e todos dizemos “a mesma coisa” e somos “unidos em um mesmo pensamento e em um mesmo parecer” (1 Coríntios 1:10).

Confissões nos Ajudam a Crescer em Paz

O fracasso em se manter mais próximo de tais “modelos de sãs palavras” permitiu a cada um falar e escrever as fantasias vãs de seu próprio coração e espalhar as mais terríveis heresias e blasfêmias com impunidade. Isso nos despedaçou e nos dividiu. Que o Senhor em misericórdia cure rapidamente esses cortes e rupturas. Um meio especial para curar isso é manter firme o modelo de sãs palavras (2 Timóteo 1:13).

Confissões nos Ajudam a Crescer em Força

Os apóstolos formularam suas decisões para ajudar aqueles que eram fracos (Atos 15:24) e uma confissão faz isso também. As verdades espalhadas por toda a Escritura estão reunidas em uma sinopse para que possamos ver com mais clareza. Onde há coisas mais obscuramente expressas, elas são mais familiarmente apresentadas àqueles de entendimento mais fraco.

Confissões nos Ajudam a Crescer em Discernimento

Confissões ajudam a descobrir e repelir sedutores e subversores das almas do povo de Deus (Atos 15:24). A mesma cerca que mantém o cervo evita a fera voraz. Elas são uma cerca para a vinha e portanto são de muito bom uso na igreja. Alguns venenos dificilmente podem ser detectados no início, mas como a boca toma sua comida, as ovelhas do pasto de Cristo discernem, por um instinto divino, que alimento é saudável e aquele que é diferente disso. Não são apenas aqueles que têm seus sentidos exercitados para discernir o bem e o mal, até mesmo o bebê recém-nascido tem esse paladar. Tão logo é feito participante da natureza divina, pode dizer quando o leite sincero da Palavra é adulterado (embora talvez não de que maneira). Um cristão piedoso (que tem um coração melhor do que a cabeça) já teve seu espírito se levantando contra algo que ele ouviu em um sermão, mas ele não podia dizer por quê. Depois foi-lhe mostrado que era uma doutrina muito corrupta.

Confissões nos Ajudam a Crescer em Saúde

Um modelo de sãs palavras é especialmente aquele pelo qual eles se recuperam e ganham saúde e força e assim prosperam. O bebê recém-nascido engorda e cresce pelo leite sincero da Palavra (1 Pedro 2:2). É um solo ruim aquele em que as plantas boas estão famintas ou doentes. É provável que seja uma dieta saudável se os homens (de outra forma bem e com saúde) não prosperam nela? Uma boa árvore (nosso Salvador nos diz) produz bons frutos e o mesmo pode ser dito da boa doutrina. Embora, pela corrupção dos corações dos homens, a boa doutrina nem sempre produza bons frutos em suas vidas, ainda que a má doutrina produza naturalmente o que é mau e abominável. Mas vamos continuamente estimar a comida espiritual saudável. O homem de Deus vive e prospera com isso e faz a vontade de Deus com alegria. Como Elias (que passou quarenta dias e quarenta noites na força do que ele comeu), o cristão continua na força desse alimento através do deserto deste mundo até chegar ao monte de Deus. Um coração sadio se deleita e prospera pela sã doutrina. Uma vez que o homem não vive só de pão, mas de toda Palavra que procede da boca de Deus, não é suficiente que estas sãs palavras tenham a aprovação do homem. Elas devem ser não apenas palavras aceitáveis, mas baseadas no que Deus instituiu, elas devem ser palavras da verdade, palavras sábias dadas pelo único Pastor.

Conclusão

Assim, certifique-se de conservar o “modelo das sãs palavras” (2 Timóteo 1:13). Como Cristo disse à igreja de Tiatira: “mas o que tendes, retende-o até que eu venha” (Apocalipse 2:25). Certifique-se de permanecer firme, tome cuidado para que você não seja roubado dele, mas tenha certeza que você o tem. Em várias passagens (Apocalipse 6:9 e Tito 1:9), manter-se firme significa que mantemos a verdade tão firmemente contra toda oposição que nenhuma força do homem ou do diabo pode forçá-la a se apartar de nós, mas que a guardamos firme contra todos.

A verdade é o bom depósito do céu (2 Timóteo 1:14) a qual Deus nos confiou. Nossas almas são o depósito (2 Timóteo 1:12) com o qual confiamos em Deus. Devemos ser tão cuidadosos com a Sua promessa quanto desejamos que ela seja nossa. Certifique-se de que seremos chamados para isso, e quão solene será se formos como o descrito em 1 Reis 20:39-40.

Este é o legado que nos foi dado pelos nossos piedosos antepassados, não deveríamos igualmente ter o cuidado de transmiti-lo à nossa posteridade (Salmos 78:3-4)? Os mártires o selaram com seu sangue, seremos culpados disso por nossa infidelidade? Esta é a melhor parte da herança de nossos filhos, como foi a lei (Deuteronômio 33:4). Certifique-se de que nossos antepassados não se envergonhem de nós e de nossa posteridade na ressurreição por trairmos a verdade de Deus e nossa fé. Manter-se firme é a ordem para muitas das igrejas descritas em Apocalipse 2 e 3, tanto as melhores quanto as piores. Manter-nos firmes pode nos levar a disputas, mas se formos fiéis no conflito, podemos ter certeza da conquista.


21 outubro 2024

O Livre-Arbítrio do Homem Caído

Estudo proferido na EBD da Igreja Presbiteriana do Ibura, em Recife/PE. 

ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER 
Capítulo IX. Do Livre-Arbítrio 

Na seção III do capítulo 9, temos o seguinte:

Seção III. O homem, ao cair no estado de pecado, perdeu inteiramente todo o poder de vontade quanto a qualquer bem espiritual que acompanhe a salvação; de sorte que um homem natural, inteiramente avesso a esse bem e morto no pecado, é incapaz de, pelo seu próprio poder, converter-se ou mesmo preparar-se para isso.

Este parágrafo da Confissão de Fé de Westminster aborda a doutrina do livre-arbítrio à luz da queda do homem. O texto declara, categoricamente, que a entrada do pecado no mundo resultou na perda total da capacidade humana de escolher o bem espiritual que conduz à salvação. Essa incapacidade é resultado direto da queda de Adão, cujas consequências se estendem a toda a sua posteridade, conforme Romanos 5:12: “Portanto, como por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens por isso que todos pecaram”. Essa condição é ilustrada em Romanos 5:6; Romanos 8:7; e João 15:5. O homem natural, em seu estado decaído, é totalmente oposto ao bem espiritual.

A Natureza Caída e a Aversão ao Bem Espiritual

O homem natural, em seu estado decaído, não apenas perdeu a capacidade para o bem, mas também se tornou inteiramente avesso a ele. A Confissão cita Romanos 3:10-12 para ilustrar essa aversão: “Não há justo, nem um sequer. Não há ninguém que entenda; Não há ninguém que busque a Deus. Todos se extraviaram, e juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem, não há nem um só”. O homem, dominado pelo pecado, encontra-se em um estado de morte espiritual, como descrito em Efésios 2:1,5 e Colossenses 2:13, incapaz de se achegar a Deus por sua própria iniciativa.

A Impossibilidade da Auto-Salvação

A Confissão de Fé de Westminster, baseada nas Escrituras, refuta a ideia de que o homem, por meio de seu próprio esforço, pode alcançar a salvação. O texto afirma que o homem natural é incapaz de converter-se ou mesmo de preparar-se para a conversão por si próprio. Essa incapacidade é enfatizada por Jesus em João 6:44 e 65, que reforça que nenhum homem pode vir a Cristo por conta própria: “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer”. A conversão, portanto, é obra da graça de Deus, que atrai o pecador a Cristo e lhe concede um novo coração, capacitando-o a crer e a obedecer.

Efésios 2:2-5 descreve essa obra da graça: "Deus, sendo rico em misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou, e estando nós mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo, — pela graça sois salvos". A salvação é um dom gratuito de Deus, concedido àqueles que se encontram em um estado de morte espiritual, incapazes de contribuir com qualquer mérito próprio.

A Escravidão da Vontade

É importante entender que, embora o homem tenha perdido a capacidade de escolher o bem espiritual, ele ainda possui livre arbítrio no sentido de que não é coagido por forças externas a agir contra sua vontade. Sua capacidade de escolha é limitada por sua natureza pecaminosa, ou seja, devido à sua natureza caída, o homem escolhe apenas o mal. Scott Price, em "A Falsa Religião do Adepto da Teoria do 'Livre-Arbítrio'", argumenta que a crença no livre-arbítrio para a salvação é uma falsa religião que se opõe à verdade divina. A Confissão, citando Jeremias 13:23, compara a incapacidade do homem de fazer o bem à impossibilidade de um etíope mudar sua pele ou um leopardo suas manchas. A vontade humana, escravizada pelo pecado, é incapaz de escolher o bem espiritual.

As Escrituras, em Gênesis 6:5; 8:21; 1 Coríntios 2:14; e Salmos 14 e 53, demonstram que os pensamentos e desejos do homem são continuamente maus. O homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus porque lhe parecem loucura (1 Coríntios 2:14). Sua mente, obscurecida pelo pecado, é incapaz de discernir as verdades espirituais.

Raniere Menezes, em "O Livre-Arbítrio dos Incrédulos", afirma que, embora os incrédulos tenham liberdade de escolha, suas escolhas são limitadas por seus desejos pecaminosos, que são determinados por sua natureza não regenerada. Ele usa a analogia de que espinheiros não produzem uvas para ilustrar que a natureza pecaminosa não pode produzir bons frutos.

Walter J. Chantry, em "O Mito do Livre-Arbítrio", argumenta que a vontade humana, embora capaz de fazer escolhas, é escrava da natureza pecaminosa do homem e não é livre para escolher o bem espiritual. Ele afirma que a vontade humana não pode alcançar nada contrário à vontade de Deus. Ele argumenta que a fé em Jesus Cristo é um ato da vontade humana, mas que essa vontade precisa ser renovada pelo Espírito Santo para que o homem possa escolher Cristo.

A Necessidade da Graça Regeneradora

Diante da incapacidade humana, a CFW destaca a necessidade da graça regeneradora do Espírito Santo. Tito 3:3-5 descreve essa obra do Espírito como um "lavar regenerador e renovador", que transforma o pecador, concedendo-lhe uma nova natureza e capacitando-o para a fé e a obediência. Somente por meio dessa intervenção divina o homem pode ser liberto da escravidão do pecado e ter sua vontade restaurada para a busca do bem espiritual.

A Confissão de Fé de Westminster, ao afirmar a incapacidade humana para o bem espiritual, não nega a responsabilidade do homem por seus atos. A responsabilidade, no entanto, não se baseia na capacidade de escolher o bem, mas no fato de que Deus é o Criador e o homem, sua criatura. O homem é responsável por obedecer aos mandamentos de Deus, mesmo que sua natureza caída o impeça de fazê-lo.

A responsabilidade do homem significa duas coisas. É uma obrigação e uma prestação de contas. Todos são obrigados a fazer o que Deus requer. É o dever de todos amar a Deus de todo o coração e o vizinho como a si mesmo (Marcos 12:29-31). Ninguém pode ser escusado desta obrigação. Isto é o que Deus requer. A responsabilidade do homem é também a sua necessidade de prestar contas. Deus nos considera responsáveis por cumprir ou não nossa obrigação. Algum dia deveremos prestar contas de nós mesmos diante do Juiz do céu e da terra. Jesus diz: “ Porque o Filho do homem virá na glória de seu Pai, com os seus anjos; e então dará a cada um segundo as suas obras” (Mateus 16:27). Deveremos prestar contas de todos nossos atos, porque somos responsáveis por todos eles.

Conclusão

A Confissão de Fé de Westminster apresenta uma visão bíblica e realista da natureza humana após a queda, enfatizando a total depravação do homem e sua incapacidade de se voltar para Deus por sua própria vontade. Aprendemos sobre a incapacidade do homem para o bem espiritual, destacando a necessidade da graça soberana de Deus para a salvação. A ênfase na depravação humana não é um fim em si mesma, mas um preâmbulo para a gloriosa doutrina da graça, que liberta o pecador da escravidão do pecado e o capacita para uma vida de fé e obediência a Deus.

08 setembro 2024

A Obra Completa de Cristo: Obediência, Sacrifício e Herança Eterna

Estudo proferido na Igreja Presbiteriana do Ibura, em Recife/PE 

ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER 
Capítulo VIII. De Cristo, o Mediador 


Na seção V do capítulo 8, temos o seguinte:
Seção V. O Senhor Jesus, pela sua perfeita obediência e pelo sacrifício de si mesmo, sacrifício que pelo Eterno Espírito, ele ofereceu a Deus uma só vez, satisfez plenamente à justiça do Pai. e para todos aqueles que o Pai lhe deu adquiriu não só a reconciliação, como também uma herança perdurável no Reino dos Céus.
Compare com o capítulo XI (Da Justificação) na seção III: “Cristo, por sua obediência e morte, pagou plenamente a dívida de todos aqueles que são assim justificados e fez uma satisfação consumada, real e plenária à justiça de seu Pai no interesse deles”.

A Perfeita Obediência de Cristo

As Escrituras afirmam que a salvação é alcançada somente pela graça, através da fé em Jesus Cristo, e não por obras da lei (Efésios 2:8,9). O Senhor Jesus Cristo, em sua perfeita obediência à lei de Deus e seu sacrifício vicário na cruz, satisfez plenamente a justiça de Deus o Pai. A Confissão de Fé de Westminster (CFW) declara: "O Senhor Jesus, pela sua perfeita obediência e pelo sacrifício de si mesmo, sacrifício que, pelo Eterno Espírito, ofereceu a Deus uma só vez, satisfez plenamente à justiça de seu Pai".

A obediência de Cristo é perfeita em dois sentidos: (1) Ele obedeceu a toda a lei de Deus durante toda a sua vida, nunca pecando (Hebreus 4:15), e (2) Ele cumpriu o papel de Mediador, cumprindo as exigências do pacto da graça (Hebreus 9:15). Romanos 5:19 declara: "Porque, como pela desobediência de um só homem, muitos foram constituídos pecadores, assim também, pela obediência de um, muitos serão constituídos justos." Cristo, sendo o segundo Adão, obedeceu onde o primeiro Adão falhou, garantindo assim a justiça para aqueles que estão nele.

O Sacrifício Vicário e a Justiça de Deus

A justiça de Deus exige que o pecado seja punido. Em Sua infinita santidade, Deus não pode ignorar o pecado ou tratá-lo de forma leviana. A Bíblia afirma claramente que "o salário do pecado é a morte" (Romanos 6:23). É por isso que um sacrifício era necessário para expiar o pecado e satisfazer as justas exigências de Deus.

Cristo, em seu grande amor, se ofereceu como sacrifício perfeito e suficiente pelos pecados do seu povo. Hebreus 9:14 declara: "muito mais o sangue de Cristo, que, pelo Espírito eterno, a si mesmo se ofereceu sem mácula a Deus, purificará a nossa consciência de obras mortas, para servirmos ao Deus vivo!". Romanos 3:25,26 acrescenta: "Deus o ofereceu como propiciação mediante a fé, no seu sangue, para demonstração da sua justiça, porque, na sua tolerância, havia Deus deixado impunes os pecados anteriormente cometidos; com o objetivo de, no tempo presente, demonstrar a sua justiça, para ele mesmo ser justo e justificador daquele que tem fé em Jesus".

A Expiação Particular e Seus Benefícios

A doutrina da expiação particular (ou definida) afirma que Cristo morreu com a intenção específica de salvar o seu povo, os eleitos, que lhe foram dados pelo Pai (João 6:37-39). Isso não significa que Cristo não ofereça benefícios a todos, como a graça comum que restringe o pecado no mundo, mas significa que a eficácia salvífica de sua morte é aplicada somente aos eleitos.

A CFW destaca: "E para todos aqueles que o Pai lhe deu adquiriu não só a reconciliação, como também uma herança perdurável no Reino dos Céus". Efésios 1:11,14 corrobora essa verdade: "Nele, também, fomos feitos herança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade [...] o qual é o penhor da nossa herança, até ao resgate da sua propriedade, em louvor da sua glória".

A eleição, baseada na livre e soberana graça de Deus, precede e fundamenta a obra expiatória de Cristo. Isso significa que a decisão de Deus de salvar Seus eleitos não é uma resposta à obra de Cristo, mas o motivo e a base para a mesma. Em outras palavras, Cristo não morreu para tornar a salvação possível a todos, para que Deus então escolhesse aqueles que creriam. Ao contrário, Deus, em Sua eterna sabedoria e amor, primeiro escolheu um povo para Si, e a expiação é a consequência e a realização dessa escolha (ver Efésios 1:4-5; João 17:2; João 6:37,39; Hebreus 9:15; Hebreus 10:14). Cristo não morreu simplesmente para tornar possível a salvação daqueles por quem ele morreu, senão que ele morreu com o intuito e para o efeito de realmente assegurar a salvação deles. 

Isso demonstra a eficácia da obra de Cristo em virtude da eleição. A morte de Cristo não remove apenas os obstáculos legais para a salvação, mas assegura a redenção completa daqueles por quem Ele morreu. É crucial notar que a doutrina da eleição não anula a necessidade da fé e do arrependimento para a salvação. As Escrituras afirmam que aqueles a quem Deus escolheu serão eficazmente chamados, regenerados e conduzidos à fé em Cristo pelo Espírito Santo (ver João 6:44; Romanos 8:30; 1 Coríntios 1:9; João 3:3-5; Tito 3:5; 1 Pedro 1:3; Efésios 2:8-9; Filipenses 1:29; 2 Tessalonicenses 2:13). A certeza da salvação dos eleitos, portanto, não elimina a responsabilidade humana, mas a garante.

Conclusão

Em suma, a obra redentora de Cristo é a expressão máxima do amor e da justiça de Deus. Através de Sua obediência perfeita e sacrifício vicário, Cristo satisfez plenamente as demandas da lei divina, reconciliando consigo mesmo todos aqueles que o Pai lhe deu. Esta obra eficaz e definitiva garante a salvação completa e a herança eterna para todos os que são chamados segundo o Seu propósito.

Perguntas para fixação

1) Qual a diferença fundamental entre a doutrina da expiação particular, como defendida pela Confissão de Fé de Westminster, e as posições arminianas, luteranas e católicas romanas?

Resposta: A diferença fundamental entre a doutrina da expiação particular, como defendida pela Confissão de Fé de Westminster, e as posições arminianas, luteranas e católicas romanas, reside na compreensão do propósito da expiação, e não necessariamente em seu alcance final.

Expiação Particular (Reformada): A Confissão de Fé de Westminster argumenta que a expiação de Cristo foi planejada e executada com o propósito específico de salvar aqueles que o Pai lhe deu, os eleitos. A morte de Cristo garante a redenção completa e eficaz para esses indivíduos.

Arminianos, Luteranos e Católicos Romanos: Essas tradições, embora concordem que a salvação é somente em Cristo e que nem todos serão salvos, geralmente sustentam que Cristo morreu para tornar a salvação possível para todos. Eles veem a obra de Cristo como a remoção do obstáculo legal da salvação (o pecado), mas não como a garantia da salvação de ninguém em particular.

Em outras palavras, a divergência central está na intenção por trás do sacrifício de Cristo:
  • A visão reformada argumenta que a expiação foi definida e eficaz, destinada a salvar os eleitos.
  • As visões arminiana, luterana e católica romana a consideram como universal em potencial, abrindo a possibilidade de salvação a todos, mas dependente da resposta humana para se tornar eficaz.
Essa diferença fundamental na compreensão da expiação tem implicações significativas para a doutrina da eleição, da graça e da segurança da salvação.

2) Quais são os benefícios específicos que a CFW afirma que Cristo adquiriu para os eleitos por meio de sua obra medianeira?

Resposta: A Confissão de Fé de Westminster (CFW) apresenta uma ênfase notável nos benefícios específicos que Cristo adquiriu para os eleitos por meio de Sua obra medianeira. Esses benefícios podem ser resumidos em duas categorias principais:

1. Reconciliação com Deus: A CFW declara que Cristo adquiriu "a reconciliação" para os eleitos. Isso significa que, através da Sua obra medianeira, a inimizade e a separação entre Deus e o homem pecador foram removidas. O sacrifício de Cristo satisfez a justiça divina e propiciou a ira de Deus, abrindo caminho para o restabelecimento do relacionamento com o Pai. A reconciliação não é apenas uma possibilidade oferecida, mas uma realidade consumada para aqueles que estão em Cristo, concedendo-lhes paz com Deus e acesso à Sua presença.

2. Herança Eterna no Reino dos Céus: Além da reconciliação, a CFW afirma que Cristo também adquiriu "uma herança perdurável no Reino dos Céus" para os eleitos. Essa herança inclui a vida eterna e todas as bênçãos espirituais que a acompanham, como a justificação, a santificação e a glorificação.

A natureza "perdurável" dessa herança destaca sua segurança e irrevogabilidade. A CFW conecta a herança eterna à eleição incondicional, ensinando que aqueles a quem o Pai deu a Cristo receberão infalivelmente a salvação completa.

Efésios 1:11,14, citado pela CFW, descreve essa herança como algo que já pertence aos eleitos em Cristo. O Espírito Santo é dado como um "penhor" dessa herança, garantindo a sua posse futura.

Em resumo, a CFW ensina que a obra medianeira de Cristo garante aos eleitos tanto a reconciliação com Deus quanto a posse segura de uma herança eterna no Seu reino. Esses benefícios são concedidos por meio da obra completa e eficaz de Cristo e recebidos pela fé, não em virtude de qualquer mérito humano. A ênfase nestes benefícios específicos demonstra a graça soberana de Deus e a certeza da salvação para todos aqueles que estão em Cristo.

26 agosto 2024

Jesus Cristo: Missão, Humilhação e Exaltação

Estudo proferido na Igreja Presbiteriana do Ibura, em Recife/PE. 

ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER 
Capítulo VIII. De Cristo, o Mediador 


Na seção IV do capítulo 8, temos o seguinte:
Seção IV. Este ofício o Senhor Jesus empreendeu mui voluntariamente. Para que pudesse exercê-lo, foi feito sujeito à lei, que ele cumpriu perfeitamente; padeceu imediatamente em sua alma os mais cruéis tormentos e em seu corpo os mais penosos sofrimentos; foi crucificado e morreu; foi sepultado e ficou sob o poder da morte, mas não viu a corrupção; ao terceiro dia ressuscitou dos mortos com o mesmo corpo com que tinha padecido; com esse corpo subiu ao céu, onde está sentado à destra do Pai, fazendo intercessão; de lá voltará no fim do mundo para julgar os homens e os anjos.
A Confissão de Fé de Westminster, em sua seção sobre Cristo, o Mediador, afirma que "Este ofício o Senhor Jesus empreendeu mui voluntariamente". Essa declaração fundamental nos leva a examinar a disposição de Cristo em se humilhar e sofrer para cumprir a vontade do Pai e realizar a salvação da humanidade. Através de sua obediência perfeita à lei, seu sofrimento vicário e sua ressurreição triunfante, Cristo se torna o único Mediador entre Deus e os homens.

A Vontade e Submissão de Cristo

A Escritura é clara ao afirmar que Cristo, embora fosse Deus, assumiu voluntariamente o papel de Mediador. Essa escolha voluntária é central para a obra da redenção, pois demonstra o amor e a misericórdia de Deus para com a humanidade caída. Hebreus 2:12-17 destaca que Cristo, "igualmente, participou" da carne e sangue para se identificar com os filhos de Abraão e socorrê-los.

A Confissão de Fé de Westminster cita o Salmo 40:7,8 para ilustrar a disposição de Cristo: "Então, disse eu: Eis-me aqui (nos rolos do livro está escrito a meu respeito), para fazer a tua vontade, ó Deus meu, me é prazer". Essa passagem revela a profunda submissão de Cristo à vontade do Pai, encontrando satisfação em cumpri-la.

É importante notar que essa submissão não implica em inferioridade ou coação. A Bíblia afirma que Cristo tinha poder para entregar sua vida e poder para reavê-la, demonstrando sua soberania mesmo em meio à humilhação (João 10:17,18).

A Humilhação de Cristo: Obediência e Sofrimento

A Confissão de Fé de Westminster detalha a humilhação de Cristo em seu ofício de Mediador. Para cumprir a vontade do Pai, Cristo se submeteu à lei, "que ele cumpriu perfeitamente" (Mateus 3:15; 5:17). Essa obediência perfeita era necessária para que Cristo pudesse ser o sacrifício perfeito pelos pecados da humanidade.

Além da obediência à lei, Cristo também suportou "os mais cruéis tormentos... em sua alma" (Mateus 26:37,38; Lucas 2:24; Mateus 27:46). Essa angústia profunda revela a gravidade do pecado e o peso da ira de Deus que Cristo carregou em nosso lugar. Hebreus 4:14-16 nos assegura que, por ter sido tentado em todas as coisas como nós, Cristo pode se compadecer de nossas fraquezas e nos socorrer em nossas necessidades.

O sofrimento de Cristo culminou na cruz, onde experimentou o abandono do Pai e a plena medida da ira divina contra o pecado. Gálatas 3:13,14 afirma que Cristo "nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se ele próprio maldição em nosso lugar". Dessa forma, Cristo se torna o bode expiatório que leva sobre si os pecados do povo, sendo expulso do arraial para que tenhamos acesso à presença de Deus.

A Glorificação de Cristo: Ressurreição, Ascensão e Intercessão

A humilhação de Cristo, porém, não foi o fim. As Escrituras profetizaram e testemunharam sua glorificação, que se inicia com a ressurreição dos mortos ao terceiro dia (1 Coríntios 15). A ressurreição é a prova irrefutável da vitória de Cristo sobre a morte e o pecado, a validação do seu sacrifício expiatório e a garantia da nossa própria ressurreição.

Após sua ressurreição, Cristo ascendeu ao céu, onde está assentado à direita de Deus Pai. Essa exaltação demonstra a soberania e o senhorio de Cristo sobre toda a criação. Filipenses 2:9-11 declara que "Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho".

A posição de Cristo à direita do Pai não é apenas de glória, mas também de intercessão. Hebreus 7:25 nos assegura que Cristo "vive sempre para interceder por nós". Como nosso Sumo Sacerdote, Cristo apresenta nossos pedidos a Deus Pai, garantindo que nossas orações sejam ouvidas e atendidas. João 17 registra a profunda intercessão de Cristo por seus discípulos, pedindo ao Pai que os guarde, os santifique e os una em amor.

A Segunda Vinda de Cristo: Julgamento e Consumação

A história da redenção, porém, não termina com a ascensão de Cristo. As Escrituras apontam para a sua segunda vinda, um evento futuro e glorioso. Atos 1:11 afirma que Cristo "virá do modo como o vistes subir". Essa segunda vinda marcará o fim da história como a conhecemos e inaugurará o novo céu e a nova terra.

A segunda vinda de Cristo será marcada por julgamento. Hebreus 9:27 declara que "está reservado aos homens morrerem uma só vez, vindo, depois disso, o juízo". Apocalipse 20:11-15 descreve o juízo final, no qual todos os povos serão julgados segundo suas obras.

A segunda vinda de Cristo também será a consumação do Reino de Deus, quando Cristo "entregará o reino a Deus, ao Pai" (1 Coríntios 15:24). Então, Deus reinará para sempre sobre um novo céu e uma nova terra, onde não haverá mais morte, tristeza, choro ou dor (Apocalipse 21:4).

Conclusão: A Centralidade de Cristo e a Urgência do Evangelho

A vida, morte e ressurreição de Jesus Cristo são o centro da fé cristã. Sua obra como Mediador é o único caminho para a salvação e a reconciliação com Deus. Romanos 10:9 declara que "se, com a tua boca, confessares Jesus como Senhor e, em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo".

Diante da certeza da segunda vinda de Cristo, somos chamados a viver em constante expectativa e prontidão. Mateus 24:44 nos adverte: “Por isso, ficai também vós apercebidos; porque, à hora em que não cuidais, o Filho do Homem virá”. Que possamos, então, viver cada dia à luz da graça de Deus revelada em Cristo, compartilhando o evangelho com ousadia e aguardando ansiosamente o retorno do nosso Rei.


22 agosto 2024

A Circuncisão e o Batismo: Uma Relação Pactual

A relação entre a circuncisão, rito prescrito no Antigo Testamento, e o batismo, sacramento instituído no Novo Testamento, tem sido objeto de extensos debates teológicos ao longo da história da Igreja. Uma análise cuidadosa das Escrituras, à luz da continuidade da aliança de Deus com seu povo, revela a profunda conexão entre esses dois sinais, ambos apontando para a inclusão na comunidade da fé e para a realidade espiritual da regeneração

A Circuncisão como Sinal da Aliança Abraâmica 

A circuncisão foi instituída por Deus como sinal da aliança estabelecida com Abraão e sua descendência (Gênesis 17:9-14). Esse rito visível selava a promessa de Deus de ser o Deus de Abraão e de seus descendentes, outorgando-lhes as bênçãos da aliança, como a terra prometida e a filiação divina. A circuncisão, realizada no oitavo dia de vida do menino, marcava a entrada na comunidade da aliança, conferindo-lhe os privilégios e responsabilidades inerentes a essa relação especial com Deus. Em Romanos 4:9-12 Paulo discute a circuncisão como "selo da justiça da fé" que Abraão já possuía antes de ser circuncidado, demonstrando que a fé era o elemento essencial desta aliança. 

É crucial observar que a circuncisão, embora realizada em crianças, não era um ato mágico que conferia automaticamente a salvação. A circuncisão simbolizava a necessidade de purificação interior e apontava para a promessa de um descendente de Abraão que traria salvação a todas as nações (Gálatas 3:16). 

O Batismo como Sinal da Nova Aliança 

Com a vinda de Jesus Cristo, a aliança de Deus com seu povo assume uma nova dimensão. A Nova Aliança, prometida pelos profetas (Jeremias 31:31-34), encontra seu cumprimento em Cristo, que, por meio de seu sacrifício expiatório, torna possível a plena comunhão com Deus. O batismo, instituído por Jesus (Mateus 28:19), torna-se o sinal distintivo desta Nova Aliança, substituindo a circuncisão como rito de iniciação na comunidade da fé (Colossenses 2:11,12). 

Assim como a circuncisão, o batismo não confere automaticamente a salvação, mas simboliza a purificação do pecado (Tito 3:5) e a entrada na comunidade da fé, com todas as suas promessas e responsabilidades. No entanto, o batismo na Nova Aliança não se limita a um povo específico por descendência física, mas se estende a todas as nações (Mateus 28:19), judeus e gentios que, pela fé em Cristo, são feitos filhos de Abraão e herdeiros das promessas (Gálatas 3:28,29). 

O Novo Testamento relata diversos casos de batismo de famílias inteiras, como a de Cornélio (Atos 10:48), Lídia (Atos 16:15) e o carcereiro de Filipos (Atos 16:33). Paulo relata em 1 Coríntios 1:16 que batizou toda a família de Estéfanas. Saber disso é importante pois é improvável que não houvesse crianças nessas famílias, o que indicaria a prática do batismo infantil. 

Essa linguagem “batismo de famílias inteiras” sugere que a estrutura familiar era significativa e que as famílias poderiam ter incluído mais do que apenas pais e filhos. É sabido que, na cultura judaica do Antigo Testamento, ter filhos era considerado uma bênção e uma parte importante da vida familiar. A infertilidade era vista como uma maldição. A circuncisão, realizada no oitavo dia de vida do menino (Gênesis 17:12), indicava que a presença de crianças era esperada e que elas eram integradas à comunidade da aliança desde muito cedo. 

A Posição da Igreja ao longo da História 

A prática do batismo infantil tem sido majoritária ao longo da história da Igreja. Desde os primeiros séculos, Pais da Igreja como Justino Mártir, Irineu e Orígenes atestam a prática como sendo de origem apostólica. 

Orígenes, por exemplo, afirmou: "A Igreja recebeu a tradição de batizar crianças dos apóstolos". Ele também faz a seguinte declaração no seu comentário sobre a Carta aos Romanos: “Era por esta razão que a Igreja tinha dos apóstolos a tradição (ou ordem) para administrar o batismo às criancinhas” (Wall, vol. I, p. 104,106). A menção ao batismo de famílias inteiras no livro de Atos (Atos 10:48; 16:15, 33), sem excluir explicitamente as crianças, também sustenta essa visão. 

Justino Mártir (100-165), um apologista cristão, é citado como alguém que "escrevendo cerca do ano 150, faz referências a pessoas de sessenta e setenta anos que tinham sido batizadas na infância." Essa referência sugere que Justino Mártir considerava o batismo infantil uma prática estabelecida na época. 

Irineu, bispo de Lyon, em sua obra "Cinco Livros contra as Heresias", teria escrito que Cristo "veio para salvar todas as pessoas por si mesmo; todas, digo eu, que por ele renascem para Deus (renascuntur in Deum); infantes, crianças, jovens e pessoas idosas". Essa citação sugere que Irineu via os infantes e crianças como parte daqueles que renascem em Cristo, o que pode ser interpretado como um indício de apoio ao batismo infantil. 

O Concílio de Cartago (252 d.C.) chegou a discutir qual a idade adequada para o batismo infantil, porém não questionou a prática em si, indicando que já era amplamente aceita. 

A prática do batismo infantil começou a ser desafiada de forma mais contundente somente a partir do século XVI, com a Reforma Protestante. O batismo infantil passou a ser contestado por grupos como os Anabatistas, que defendiam o batismo apenas de adultos como expressão de uma fé consciente. Essa divergência se mantém até os dias atuais, com vertentes protestantes como Batistas e Pentecostais rejeitando o batismo infantil, enquanto outras, como Presbiterianos, Luteranos e Anglicanos, o mantém como prática tradicional. 

É importante observar que a Confissão de Fé de Westminster, um dos documentos confessionais mais importantes do protestantismo reformado, defende a inclusão de "filhos de pais crentes" no batismo, reconhecendo-os como participantes da aliança (CFW, 28,iv). 

Conclusão 

A relação entre circuncisão e batismo é profunda e reveladora da continuidade do plano redentor de Deus. Ambos os ritos, embora distintos em sua forma, apontam para a mesma realidade: a inclusão na aliança de Deus e a necessidade de purificação do pecado. 

A prática do batismo infantil, embora contestada por alguns grupos cristãos, encontra forte respaldo nas Escrituras, na história da Igreja Primitiva e nos documentos confessionais de diversas denominações protestantes. A inclusão de crianças na comunidade da fé, por meio do batismo, reflete a graça abrangente de Deus, que se estende aos pequeninos e cumpre suas promessas de geração em geração. 


18 agosto 2024

Jesus Cristo e Seu preparo para o Ofício de Mediador

Estudo proferido na Escola Bíblica Dominical na Igreja Presbiteriana do Ibura, em Recife/PE. 

ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER 
Capítulo VIII. De Cristo, o Mediador 


Na seção III do capítulo 8, temos o seguinte:
Seção III. O Senhor Jesus, em sua natureza humana unida à divina, foi santificado e sem medida ungido com o Espírito Santo tendo em si todos os tesouros de sabedoria e ciência. Aprouve ao Pai que nele habitasse toda a plenitude, a fim de que, sendo santo, inocente, incontaminado e cheio de graça e verdade, estivesse perfeitamente preparado para exercer o ofício de Mediador e Fiador. Este ofício ele não tomou para si, mas para ele foi chamado pelo Pai, que lhe pôs nas mãos todo o poder e todo o juízo e lhe ordenou que os exercesse.

A Natureza Humana de Cristo Equipada para a Obra Mediadora

As Escrituras ensinam que Jesus Cristo, em sua natureza humana unida à divina, foi santificado e ungido com o Espírito Santo sem medida (Salmos 45:5; João 3:34). Isso significa que Ele recebeu a plenitude do Espírito Santo, não de forma limitada como os profetas e reis do Antigo Testamento (João 3.34; Lucas 4.18). Essa unção era necessária porque, embora Cristo fosse plenamente Deus, Ele também era plenamente homem (João 14:10; Hebreus 2:14-18). Como homem, Ele precisava do poder capacitador do Espírito Santo para cumprir a obra da redenção (Mateus 3:16-17; Marcos 1:10-11; Lucas 3:21-22; João 5:19-30).

É importante observar que Cristo não precisava do Espírito Santo para a salvação pessoal, pois Ele era sem pecado (Hebreus 7:24-26). No entanto, para realizar a obra que o Pai lhe havia designado, a saber, a obra da redenção, Ele dependia totalmente do Espírito Santo (Atos 10:37,38; João 8.28).

A unção do Espírito Santo em Cristo se manifestava de diversas maneiras:
  • Sabedoria e Conhecimento: Colossenses 2:3 afirma que em Cristo estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento.
  • Poder para Realizar Milagres e Curar: Atos 10:38 relata que Jesus foi ungido com o Espírito Santo e poder para fazer o bem e curar os oprimidos do diabo.
  • Obediência Perfeita: A vida de Cristo foi marcada por uma obediência perfeita à vontade do Pai, evidenciando a obra do Espírito Santo em Sua vida (João 4:34; 5:30).
A Necessidade da Natureza Divina de Cristo

Embora a unção do Espírito Santo fosse essencial para capacitar a natureza humana de Cristo, é crucial destacar que a Sua natureza divina também era indispensável para a obra da redenção.

  • Sofrimento Vicário: Somente alguém que fosse infinito em sua capacidade de sofrimento poderia suportar a ira de Deus pelos pecados do mundo. A natureza divina de Cristo tornou isso possível (Isaías 53:5).
  • Autoridade sobre a Morte: Jesus afirmou ter o poder para dar a sua vida e retomá-la (João 10:17). Essa autoridade sobre a morte só poderia pertencer a alguém que fosse mais do que um mero homem.
  • Acesso Eficaz a Deus: Como nosso mediador, Cristo precisava ter acesso garantido a Deus em nosso favor. Sua natureza divina lhe concedeu essa posição privilegiada (Hebreus 4:14-16; Hebreus 7:25; Romanos 8:34; 1 João 2:1).
O Chamado Divino e a Autoridade de Cristo

O ofício de Mediador e Fiador não foi algo que Cristo tomou para si, mas foi chamado pelo Pai para exercê-lo. Hebreus 5:4-5 afirma que ninguém toma para si essa honra, mas deve ser chamado por Deus, assim como Arão foi chamado para o sacerdócio.

O Pai, ao chamar Cristo para essa missão, investiu-o com toda a autoridade e poder necessários para realizá-la:
  • Todo Poder e Juízo: João 5:22,27 declara que o Pai confiou todo o julgamento ao Filho. Mateus 28:18 acrescenta que toda a autoridade no céu e na terra foi dada a Cristo.
  • Senhor e Cristo: Atos 2:36 proclama que Deus exaltou Jesus como Senhor e Cristo.
Conclusão

Em suma, a unção do Espírito Santo foi fundamental para capacitar a natureza humana de Cristo para a obra da redenção. No entanto, essa unção não substitui a necessidade da Sua natureza divina. Foi a união perfeita dessas duas naturezas em uma só pessoa que tornou Cristo o único mediador qualificado e suficiente entre Deus e os homens.


12 agosto 2024

Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem

Estudo proferido na Escola Bíblica Dominical na Igreja Presbiteriana do Ibura, em Recife/PE. 

ESTUDOS NA CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER 
Capítulo VIII. De Cristo, o Mediador 


Na seção II do capítulo 8, temos o seguinte:
Seção II. O Filho de Deus, a Segunda Pessoa da Trindade, sendo verdadeiro e eterno Deus, da mesma substância do Pai e igual a ele, quando chegou o cumprimento do tempo, tomou sobre si a natureza humana com todas as suas propriedades essenciais e enfermidades comuns, contudo sem pecado, sendo concebido pelo poder do Espírito Santo no ventre da Virgem Maria e da substância dela. As duas naturezas, inteiras, perfeitas e distintas - a Divindade e a humanidade - foram inseparavelmente unidas em uma só pessoa, sem conversão, composição ou confusão; essa pessoa é verdadeiro Deus e verdadeiro homem, porém, um só Cristo, o único Mediador entre Deus e o homem.
O cerne da fé cristã reside na pessoa de Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem, que transcende os limites da compreensão humana em virtude de sua natureza dual. A doutrina da União Hipostática, pilar fundamental da cristologia, postula a coexistência indissolúvel das naturezas divina e humana em Cristo, sem confusão, divisão ou alteração. Essa concepção teológica, ao longo dos séculos, tem suscitado intensos debates e controvérsias, desafiando a racionalidade humana a apreender o mistério da encarnação e a reconciliar a divindade e a humanidade em uma única pessoa.

A Necessidade da Humanidade de Cristo

A Bíblia deixa claro que Jesus, a segunda pessoa da Trindade, assumiu a natureza humana em um ato de auto-humilhação e amor sacrificial (João 1:14; Filipenses 2:5-8; Romanos 5:8; João 3:16; Mateus 20:28). Essa encarnação era essencial para a obra redentora de Cristo, pois somente um homem poderia sofrer a penalidade do pecado em lugar da humanidade (Hebreus 9:27). Hebreus 2:14-17 afirma que Ele "participou" da carne e sangue, tornando-se semelhante aos seus "irmãos" em todos os aspectos, exceto no pecado.

A humanidade de Cristo se manifesta em:

  • Nascimento de uma mulher: A concepção de Jesus no ventre da virgem Maria pelo poder do Espírito Santo demonstra sua entrada real na história humana como um de nós (Mateus 1:18; Lucas 1:35; João 1:14).
  • Corpo físico: As Escrituras descrevem Jesus com um corpo real, sujeito a necessidades e fragilidades humanas como fome, sede, cansaço e dor (João 4:6-8; Lucas 24:41-43; Hebreus 2:17; Marcos 15:34). Ele suou, chorou, sentiu fome e experimentou a morte física na cruz (Lucas 22:44; João 11:35; Marcos 15:37; Atos 2:24).
  • Alma humana: Jesus possuía uma alma humana, comprovada por suas emoções, intelecto e desenvolvimento moral. Ele "crescia em sabedoria" (Lucas 2:46-52; Mateus 7:28-29) e experimentou profunda tristeza e angústia (Marcos 14:33).
  • Limitações humanas: Apesar de ser Deus, Jesus, em sua natureza humana, se submeteu às limitações do tempo e espaço. Ele não estava presente em todos os lugares ao mesmo tempo, como afirma a doutrina da onipresença divina (Marcos 6:31).
É crucial reconhecer a plena humanidade de Cristo para entender o alcance de seu sacrifício. Ele se esvaziou de sua glória divina, tomando a forma de servo e se tornando obediente até a morte (Filipenses 2:6-8; João 1:14).

A Realidade da Divindade de Cristo

As Escrituras testificam com igual ênfase que Jesus Cristo é plenamente Deus, coexistindo eternamente com o Pai e o Espírito Santo em perfeita unidade e igualdade. Diversas evidências bíblicas apontam para sua divindade:

  • Títulos divinos: A Bíblia atribui a Jesus nomes e títulos reservados exclusivamente a Deus, como "Deus" (João 1:1; Romanos 9:5), "Senhor" (Filipenses 2:9-11; Colossenses 1:19), "Verbo" (João 1:1-3) e "Eu Sou" (João 8:58).
  • Atributos divinos: A Bíblia aplica a Jesus atributos exclusivos de Deus, como eternidade (Miquéias 5:2; Hebreus 1:8), onisciência (João 2:25; Apocalipse 2:23), onipresença (Mateus 28:20; João 3:13) e onipotência (Filipenses 4:13; Colossenses 1:16).
  • Obras divinas: Jesus realizou obras que somente Deus pode realizar, como a criação do universo (João 1:3; Colossenses 1:16), a sustentação de todas as coisas (Hebreus 1:3) e a ressurreição dos mortos (João 5:21,25).
  • Adoração divina: A Bíblia ordena e relata a adoração a Jesus Cristo como Deus. Anjos e homens o adoram (Hebreus 1:6; Lucas 24:52), e o batismo é realizado em seu nome, juntamente com o Pai e o Espírito Santo (Mateus 28:19).
A divindade de Cristo é confirmada por sua própria consciência e reivindicações. Ele se autodeclarou igual a Deus (João 5:17), afirmou existir antes de Abraão (João 8:58) e perdoou pecados, uma prerrogativa divina (Marcos 2:1-12).

Negar a divindade de Cristo é reduzir sua pessoa a um mero homem, invalidando seu sacrifício expiatório e minando o fundamento da fé cristã. Se Jesus não fosse Deus, ele não teria poder para perdoar pecados, vencer a morte e conceder a vida eterna.

A União Incompreensível: Duas Naturezas em Uma Pessoa

A união hipostática, a união das naturezas divina e humana em uma única pessoa, está além da capacidade humana de compreensão plena. As Escrituras afirmam essa união sem tentar explicá-la em termos filosóficos. No entanto, a Bíblia oferece vislumbres que iluminam essa doutrina profunda:

  • Unidade: As duas naturezas de Cristo coexistem em perfeita harmonia e unidade, sem mistura, confusão, separação ou divisão.
  • Distinção: As naturezas divina e humana, embora unidas em Cristo, mantêm suas propriedades distintas. A divindade não se torna humana nem a humanidade divina.
  • Integração: As duas naturezas operam em perfeita harmonia na pessoa de Cristo. Atributos e ações podem ser atribuídos a sua pessoa, independentemente de se originarem em sua natureza divina ou humana. Por exemplo, (1) Jesus realizando milagres: Ao curar os enfermos, ressuscitar os mortos e controlar os elementos da natureza, Jesus demonstrava seu poder divino, mas ao mesmo tempo expressava sua compaixão humana. (2) Jesus sofrendo: Ao ser tentado, sentir fome, sede e fadiga, Jesus experienciou as mesmas limitações que nós, demonstrando sua plena humanidade. (3) Jesus perdoando pecados: Ao perdoar os pecados, Jesus exercia seu poder divino de autoridade sobre o pecado, mas ao mesmo tempo demonstrava sua misericórdia e graça.
A união hipostática é um mistério revelado por Deus e recebido pela fé. Embora desafie a compreensão humana, essa doutrina é a base para a salvação. Somente um Salvador que é plenamente Deus e plenamente homem pode ser o mediador perfeito entre Deus e a humanidade, satisfazendo as demandas da justiça divina e, ao mesmo tempo, se compadecer de nossas fraquezas.

A Doutrina das duas naturezas de Cristo ao longo da história

A igreja cristã enfrentou muitos desafios à doutrina da divindade de Cristo ao longo de sua história, particularmente nos séculos IV e V. Esses desafios, frequentemente chamados de heresias, forçaram a igreja a definir mais claramente suas crenças e convocar concílios para resolver disputas doutrinárias e condenar os ensinamentos heréticos.

Aqui estão alguns exemplos importantes:

  • Docetismo: Essa heresia, prevalente nos primeiros séculos da igreja, negava a verdadeira humanidade de Cristo, afirmando que ele apenas parecia ter um corpo físico. A igreja primitiva rejeitou fortemente o docetismo, enfatizando a realidade da encarnação de Cristo e a importância de sua humanidade para a salvação. O apóstolo João, por exemplo, argumentou que negar que Jesus realmente se manifestou na carne era uma marca do anticristo (1 João 4:2,3).
  • Arianismo: Surgindo no século IV, o arianismo, liderado por Ário, ensinava que Jesus era um ser criado, embora exaltado, e não eterno e igual a Deus, o Pai. O Concílio de Nicéia, em 325 d.C., foi convocado especificamente para lidar com essa heresia. O concílio rejeitou o arianismo, afirmando que Jesus é "gerado, não criado" e "da mesma substância (homoousios) do Pai". Essa declaração enfatizou a plena divindade de Cristo e sua igualdade com o Pai (ver João 1:1; Hebreus 1:3; Filipenses 2:6; Colossenses 1:15-17; João 14:9).
  • Monofisismo: Essa heresia, surgindo no século V, afirmava que Jesus tinha apenas uma natureza, uma mistura divina e humana, em vez de duas naturezas distintas (divina e humana) unidas em uma pessoa. O Concílio de Calcedônia, em 451 d.C., condenou o monofisismo, afirmando que Jesus Cristo é "perfeitamente Deus e perfeitamente homem" em duas naturezas "sem mistura, confusão, separação ou divisão".
Além dessas grandes heresias, a igreja lidou com outras variações de crenças sobre a natureza de Cristo:

  • Apolinarismo: Essa heresia negava a plena humanidade de Cristo ao afirmar que ele não possuía uma alma humana, mas que o Logos divino (a Palavra) tomava o lugar de sua alma. A igreja rejeitou essa visão, afirmando que Cristo tinha tanto um corpo quanto uma alma humana, além de sua natureza divina.
  • Nestorianismo: Contrário ao monofisismo, o nestorianismo enfatizava demais a distinção entre as naturezas divina e humana de Cristo, sugerindo que ele era duas pessoas distintas. A igreja rejeitou essa visão, afirmando a unidade da pessoa de Cristo, enquanto mantinha a distinção de suas duas naturezas.
Esses debates e as definições doutrinárias resultantes moldaram profundamente a teologia cristã e continuam sendo tópicos importantes de discussão e estudo teológico hoje.

Considerações e Conclusões

A doutrina da união hipostática nos convida a contemplar o amor incomensurável de Deus, que enviou seu Filho ao mundo na semelhança da carne pecaminosa para nos reconciliar consigo mesmo.

Em Cristo, encontramos a expressão máxima da graça e da verdade. Ele é o único caminho para o Pai, o único nome dado entre os homens pelo qual podemos ser salvos (ver João 14:6; Atos 4:10-12; Romanos 5:8). Que a contemplação da pessoa de Cristo, Deus encarnado, gere em nós profunda gratidão, adoração e um desejo insaciável de conhecê-lo mais e viver para a sua glória.